“A boa vontade não chega”


Cândido Costa passou por alguns dos principais clubes do futebol português, como jogador. Depois de pendurar as chuteiras, 'aventurou-se' como treinador da equipa feminina da Ovarense. 

Fomos descobrir como é que o ex-jogador lidou com esta transição e qual a sua opinião sobre o futebol feminino em Portugal.

O Cândido foi jogador de futebol durante muitos anos. Por que razão decidiu abraçar a carreira de treinador?
Francamente não foi uma coisa pensada, surgiu com naturalidade. O meu foco era acabar o 12.º ano e foi isso que fiz. O presidente da Ovarense convidou-me para ficar com os seniores masculinos, mas não quis porque eram os meus ex-colegas, com os quais tinha acabado a carreira. Acabei por ir para o futebol feminino.

Que principais diferenças nota entre o futebol feminino e o masculino?
Poucas. Acho que essa diferença vem das ideias pré-concebidas que as pessoas têm. As jogadoras vivem o jogo, estão apaixonadas, tal e qual como os homens. Gostam do que fazem e têm brio no desempenho da profissão, mesmo não sendo profissionais.

Nota que as jogadoras têm dificuldades em conciliar o horário dos treinos com o trabalho ou a escola?
As jogadoras não vivem do futebol e, como tal, têm de ter uma fonte de rendimento. Mas a Federação e os clubes têm de dar a conhecer esta realidade, para se perceber que não há assim tantas diferenças entre as equipas.

O que falta para chegarmos à profissionalização do futebol feminino?
Faltam mais raparigas a querer jogar futebol e os clubes terem condições para tal. A boa vontade não chega. E, sobretudo, falta olhar para o futebol feminino com olhos de ver, com respeito e apreço e valorizar as atletas, porque elas correspondem com muita paixão.

O Sporting e o SC Braga aderiram esta época ao futebol feminino. Aconselha clubes como o FC Porto e o Benfica a fazerem o mesmo?
Aconselho o Porto, o Benfica, o Sporting, o Braga. É extremamente positivo esses clubes aderirem ao futebol feminino, pois são clubes potenciadores. O ideal seria que à medida que esses clubes vão aparecendo com toda a sua força e potencialidade, darem ferramentas aos outros clubes que já existem para poderem competir de igual para igual.

Como está a correr este novo desafio?
Dentro da normalidade. Estou a tentar fazer um trabalho honesto com elas e levo sempre a sério aquilo em que me envolvo. Nem gosto muito de me chamar treinador. Sou muito mais gestor. Acho que o meu maior feito na Ovarense foi ter conseguido reinventar atletas que já há muito tinham perdido a chama no futebol feminino e fi-las acreditar outra vez.

Foi uma adaptação difícil?
Não. No início algumas tinham vergonha de olhar para mim e percebi que tinha de ser uma pessoa despida de qualquer vaidade para elas acreditarem em mim e provar que sou exatamente igual a elas. E quando as jogadoras sentiram isso, foi muito gratificante.

Há algum conselho que queira deixar aos treinadores que se estejam a estrear no futebol feminino?
Que sejam sinceros com as miúdas. Acho que elas merecem. No nível não profissionalizado, o melhor que podemos ser é sermos verdadeiros para as jogadoras. Somos quase uns segundos pais para elas.

Qual é a sua opinião sobre a atuação do SJPF no domínio do futebol feminino?
Acho que tem feito um trabalho muito interessante. Dou-me muito bem com a Carla Couto, que desenvolve sempre um trabalho muito positivo. Não escolhem clubes, referências nem estatutos. Têm um trabalho que abrange todas as equipas. É muito positivo.

Perfil
Nome: Cândido Alves Moreira da Costa
Data de nascimento: 30 de abril de 1981
Clubes que representou como treinador: Sanjoanense (treinador adjunto da equipa masculina) e Ovarense (treinador principal da equipa feminina).

Foto: Eduardo Oliveira/ASF.