Luís Filipe: Uma vida de mudanças


Campeão no Sporting e no Benfica, Luís Filipe fica na história como o autor do primeiro golo no novo Estádio de Alvalade.

Terminou uma longa carreira no Olhanense e continua pelo Algarve mas, em vez de golos e assistências, hoje produz framboesas.

Encontrámo-lo entre Faro e Olhão, numa quinta perto da famosa estrada nacional 125. Ao contrário da música de António Variações, Luís Filipe mudou de vida não por viver insatisfeito, mas porque o final da carreira de jogador a isso o obrigou. Ainda estava a jogar e tinha amigos na área da comercialização de framboesas e despertou-lhe o interesse.

“Queria manter-me pelo Algarve e pensei em fazer uma quinta para a produção destes frutos, este clima é muito propício. De momento só tenho framboesa, não quer dizer que não poderei ter outro tipo de fruto até porque tenho a estrutura montada. É só uma questão de mudar as plantas.”

São 3,5 hectares, o equivalente a quatro campos de futebol, com estufas e tudo o que produz é para exportação, principalmente para o norte da Europa. “Já dá muito trabalho. Somos uma empresa pequena, com pouca gente. Já precisávamos de uma estrutura maior, mas estamos a começar”, afirma Luís Filipe, que gosta de acompanhar todo o processo “até por uma questão de conhecimento e de estar dentro daquilo que é o negócio.”

Natural de Cantanhede, o antigo jogador cresceu num meio de agricultura, mas ter esta quinta não era um sonho de infância. “Avancei com isto mais na perspetiva de negócio. O meu pai tem vinhas e terras, sou da Bairrada, é uma zona do país onde muita gente vive da agricultura, cresci nesse meio. Quando era miúdo ainda ajudei bastante nas vindimas ou a apanhar batatas, era uma coisa que não me assustava. Assustava-me mais o investimento, que ainda é elevado. Mas já tinha esta ligação à terra”, admite.

UM GOLO PARA A HISTÓRIA
Ficou para a história como o autor do primeiro golo do novo estádio de Alvalade e hoje ainda lhe falam desse momento. “Infelizmente não fui um jogador que jogasse tanto como queria no Sporting e acho que as pessoas não me reconhecem por aquilo que fiz durante os anos que lá estive, mas por esse dia. É óbvio que me deixa orgulhoso, serei reconhecido até ao próximo estádio por esse feito. Estar na história de um clube com a grandeza do Sporting deixa-me realmente satisfeito.”

Antes do Sporting, despontou na Académica e foi contratado pelo Atlético de Madrid. Uma passagem difícil, até pela idade. “Com 19 anos éramos uns miúdos. Nunca tinha saído daqui e senti dificuldades por isso. As coisas acabaram por não me correr bem e decidi vir-me embora. Mas fez-me crescer e foi mais uma etapa”, reconhece.

Seguiu-se o SC Braga, o clube no qual mais jogou, numa fase em que os minhotos se afirmavam como um grande do futebol nacional. “Passei no SC Braga numa fase completamente ascendente. Numa primeira altura, antes de ir para o Sporting, em que já se notava que o clube estava a crescer, ainda no antigo Estádio 1.º de maio. Numa segunda fase, já no estádio novo, começámos a entrar na fase de grupos da Liga Europa, a atingir cada vez patamares mais acima”, recorda.

Para Luís Filipe, hoje o SC Braga está lá em cima com mérito próprio porque cresceu de uma forma sustentada. “Foi o clube onde fui mais feliz desportivamente, onde me senti melhor, onde fiz mais e melhores jogos. Aquela casa vai marcar-me para sempre”, partilha.

DE EXTREMO A LATERAL, A PRIMEIRA MUDANÇA
Brilhou como extremo e recuou para lateral direito, uma mudança que viu como positiva e uma evolução natural. “Era um extremo tipicamente à antiga e, com a evolução do futebol, deixou de haver esse tipo de extremos. Houve uma adaptação natural a um lugar mais propício às minhas características. Acabei por passar para lateral direito na altura certa e penso que tive sucesso em ambas as posições.”

Campeão no Sporting e no Benfica, hoje torce pelos encarnados, o clube de infância. “No Sporting fui campeão, inaugurei o Estádio de Alvalade e é com muito carinho que sinto aquele clube. No Benfica também fui campeão e assinar pelo Benfica foi um sonho de criança. Depois tornamo-nos profissionais e não torcemos realmente por ninguém. Hoje torço mais pelo Benfica, mas tenho um carinho por todos os clubes por onde passei.”

Terminou a carreira e a ligação que tem ao futebol é a de um adepto comum. Nem a proximidade ao estádio do Olhanense o motivam a ir ver os jogos do clube no qual terminou a carreira em 2014. “Aproveito os fins-de-semana para estar com a família, coisa que não fazia quando jogava. Acompanho os meus filhos às suas atividades, ao futebol e aos vários desportos em que andam. Não me passa pela cabeça ir ver jogos ao fim-de-semana”, diz.

Apesar desse certo distanciamento, Luís Filipe está atento e tem uma visão interessante sobre o trabalho do Sindicato no futebol português. “É um trabalho muito bom. Podia ser melhor, mas é muito por culpa dos jogadores. Se todos os jogadores fossem associados tudo seria muito mais fácil. Acho que os jogadores, principalmente dos clubes grandes, que têm uma influência muito maior, deviam de juntar-se em prol daquilo que seria melhor para todos e às vezes isso não acontece”, aponta.

E dá o exemplo do que acontece lá por fora como o caminho a seguir. “Nos outros países são os jogadores dos grandes clubes que se juntam, que tomam posições e tem outro impacto. Acho que falta acontecer isso para que o Sindicato seja cada vez mais forte e seja visto como uma entidade que tem de ser tida em conta.”