“Não faço uso da braçadeira para mostrar que sou líder”


O experiente médio do Varzim está sempre disponível para ajudar os colegas de equipa.

Mereceu a braçadeira de capitão do Varzim. Como foi eleito para o cargo?
Foi uma situação natural, acho que partiu muito dos treinadores. Já estou no clube há algum tempo e passou um bocado por aí também. Cheguei a capitão na altura da subida à II Liga, era o Tiago Lopes e eu. Depois o Tiago saiu e, como era o sub-capitão, fiquei eu.

Já tinha sido capitão noutros clubes?
Cheguei a ser no Ribeirão. Acho que durante meio ano.

Sente que impõe uma liderança natural no balneário?
Acho que têm respeito por mim, como eu tenho por eles, mas não faço uso da braçadeira para mostrar que sou líder. Eles sabem que se podem dirigir a mim se houver alguma coisa de que precisem, mesmo coisas fora do balneário. E tenho alguns anos de clube e de Liga, também é por aí.

Há algum capitão que tenha como exemplo?
Sinceramente, nunca pensei nisso. Tive um capitão que posso mencionar, o Marco Silva, o atual treinador do Everton, que foi meu capitão no Estoril. Acho que até foi no último ano dele, ele não jogava muito, e gostei muito da maneira de ele ser e de lidar com as coisas. E notava que o pessoal tinha mesmo respeito por ele.

Que valores transmite aos mais jovens e a quem chega ao clube?
Quando os jogadores são mais jovens há aquela “irresponsabilidade”, às vezes querem facilitar um bocado, e costumo dizer-lhes que se querem ser alguém, se querem ir para um clube maior que o Varzim, têm de se aplicar todos os dias. Também demonstro isso com o meu trabalho. Sinto que olham para mim e veem aquilo que faço antes dos treinos. Em relação ao clube, aos poucos vão-se apercebendo de como é que isto funciona. Se precisarem de alguma coisa falam comigo, naturalmente, mas vão conhecendo a exigência do clube passo a passo.

Como capitão, alguma vez precisou de chamar um colega à atenção de uma forma mais “autoritária”?
Não de uma forma que fosse por mal, mas às vezes falo, até mais em situações de jogo. Não berro com eles, mas às vezes falo com os meus colegas de uma forma mais brusca. Mas sempre para incentivar, para que eles melhorem. Sempre pela positiva.

Ter de assumir esse papel é uma situação ingrata ou é natural?
É uma situação natural, se não fosse capitão faria a mesma coisa. Com o calor do jogo ou do treino, às vezes é preciso chamar alguém à atenção. Mas, como sabem que sou capitão, se calhar têm mais atenção àquilo que digo.

Do que é que os capitães costumam falar quando trocam galhardetes? Muitas vezes vemos os jogadores e o próprio árbitro a rir.
É um momento de descontração. O árbitro também diz algumas palavras no sentido de ser um jogo tranquilo, pede para tanto eu como o capitão da outra equipa o ajudarmos em termos de jogo, para ser um bom jogo, que não seja quezilento. Normalmente desejo boa sorte ao outro capitão e que ninguém se magoe.

E costuma haver algum tipo de picardia saudável com o outro capitão? Algumas bocas na brincadeira?
Se já tivermos mais confiança com o outro capitão pode haver uma ou outra conversa, mas tem de ser muito rápida porque estamos ali para outras coisas, para a escolha de campo e da bola. [risos] Mas sim, às vezes acontece. Sempre na brincadeira.

Os árbitros costumam ser mais tolerantes com os protestos dos capitães?
Não é que sejam mais tolerantes, protestos eles nunca admitem, e geralmente pedem-nos ajuda. Aproveitam as paragens de jogo e dirigem-se a mim para ir falar com um colega, se houver um que esteja a protestar mais, para se acalmar. Acho que ajuda a que o jogo corra melhor.

Alguma vez foi expulso por palavras enquanto capitão?
Sinceramente, acho que não. Não me lembro, penso que não. Posso exaltar-me uma vez ou outra, mas são breves segundos. Depois o árbitro vai falar comigo de forma a acalmar-me e a coisa passa. Tem de haver alguém que acalme e têm de ser os capitães a meter um bocado de calma para não acontecerem coisas mais graves.

Cumpre a sua nona época no Varzim. Qual foi a mais marcante?
A época mais marcante foi aquela na qual o Varzim subiu de divisão. As épocas têm corrido dentro daquilo que se tem esperado, mas a época de 2014/15 foi marcante por isso.

Está prestes a fazer 39 anos e, apesar da idade, todos os anos faz mais de 40 jogos. Há algum segredo para essa consistência?
É o trabalho e ter sempre a mesma determinação, sempre a mesma vontade de ir treinar e de jogar. E ter a felicidade de não ter lesões. Felizmente não as tenho tido. E é o trabalho diário. O calendário vai passando, fica cada vez mais difícil, e eu não posso facilitar em nada. Além do gosto que tenho pelo futebol, da alegria que ainda sinto, meti na cabeça que tenho de dar sempre ao cabedal, trabalhar sempre nos limites, porque só assim é que consigo fazer a média de jogos que tenho feito nos últimos anos.

Houve um ano em que esteve muito perto de jogar na I Divisão, quando esteve no SC Braga. Ficou um sabor amargo por não se ter estreado?
Agora não penso tanto nisso, mas claro que houve uma altura em que pensava porque era um objetivo e não foi cumprido. Mas, sinceramente, não culpo ninguém porque o principal culpado fui eu. Tenho noção de que na altura devia ter a mentalidade que tenho de há uns anos a esta parte. Na altura não tive essa mentalidade nem a capacidade de me impor. Ficou um bocado encravado, a minha vida podia ter sido outra, mas já não posso pensar mais nisso.

E gostava de ter jogado no estrangeiro? Chegou a ter essa possibilidade?
Tive um convite do Chipre em 2008, tinha acabado de chegar ao Varzim, e arrependo-me um bocado de não ter arriscado. Tive vários colegas que jogaram lá e deram-se bem. Vou dar um exemplo que conheço, do Hélder Sousa: foi para o APOEL, jogou na Champions…. Isso é uma coisa na qual penso mais do que em não ter jogado na I Liga. Se calhar devia ter arriscado. Na altura, em termos de valores não era assim muito mais, não era assim tão aliciante, e a minha filha tinha acabado de nascer. Achei melhor ficar.

Como tem visto a atuação do Sindicato dos Jogadores no futebol português?
Assume um papel importante no futebol, principalmente para os jogadores. Alertam e estão sempre do lado dos jogadores. Eu próprio tenho um caso em que o Sindicato me está a ajudar e têm feito um excelente trabalho na defesa dos jogadores.


Perfil
Nome: Nélson Manuel Ribeiro da Silva (Nelsinho)
Data de nascimento: 28 de julho de 1979
Posição: Médio
Percurso como jogador: Vizela (formação), Vizela, Fafe, SC Braga, Estrela da Amadora, Fafe, Trofense, Gondomar, Varzim, Estoril, Varzim, Ribeirão e Varzim.