“Tenho uma carreira consolidada, mas tive de me esforçar bastante”


Natural do Brasil e internacional pela Bielorrússia, cumpriu a quarta época em Portugal.

Chegou a Portugal em 2014 para representar o Rio Ave. Adaptou-se bem ao futebol português?
Os primeiros três meses foram um período de adaptação. Já tinha jogado na Europa antes de vir para Portugal, mas era um pouco diferente, era outro nível, outra situação. Mas depois correu tudo bem e acredito que tenho feito um bom trabalho em Portugal.

Qual foi a maior dificuldade?
Tinha jogado noutros países europeus e normalmente em clubes que eram campeões, como o BATE Borisov e o Astana, então não precisava de marcar tanto e a intensidade do futebol era menor. Só jogava para a frente, não tinha o trabalho de defender. E quando cheguei a Portugal reparei que a intensidade era muito maior e essa parte da marcação é muito importante. Se eu tivesse vindo jogar para o Benfica ou para o FC Porto talvez me tivesse adaptado mais rápido porque já era o que tinha passado no Leste europeu. Como fui para o Rio Ave, um clube médio/bom, digamos assim, tinha de defender e a intensidade de jogo era maior.

Os portugueses são considerados um povo hospitaleiro. Confirma?
Sim, muito. Também por isso, quando apareceu a oportunidade de regressar a Portugal, para o Chaves, passados seis meses tive oportunidade de sair novamente e não quis porque a minha família está totalmente adaptada, o meu filho já começou a escola e eu gosto muito de Portugal, das pessoas e do país em termos gerais. Estou muito contente e um dos motivos para jogar em Portugal é as pessoas serem tão hospitaleiras.

Antes esteve cinco anos na Bielorrússia, mais dois na Rússia e no Cazaquistão. Como é que surgiu a possibilidade de trocar o desconhecido Atlético Tubarão, do Brasil, pelo Gomel, da Bielorrússia?
Na altura, na verdade, ia para um clube da Ucrânia. Há uns anos, uns empresários ucranianos tinham comprado um clube brasileiro, o União Barbarense, e andavam pelo Brasil atrás de jogadores. Num desses dias foram a Tubarão, a minha cidade natal, foram ver um jogo amigável. Gostaram de mim, viram que tinha um estilo europeu, e foi assim. Foi tudo muito rápido e aceitei o desafio.

E a adaptação ao país? Nos momentos mais difíceis alguma vez equacionou voltar ao Brasil?
Nos primeiros meses chorava todos os dias, ligava para os meus pais e queria voltar. Tinha acabado de fazer 18 anos, estava num país bastante frio, com uma cultura bastante diferente, mas via que ali estava a minha oportunidade de fazer uma carreira consolidada, era o futuro que eu queria, e passei por muitas dificuldades. Costumo brincar com os meus amigos e familiares e digo que hoje como filé mignon. Tenho uma carreira consolidada, mas tive de me esforçar bastante porque foi uma fase muito complicada.

O que o motivou a representar a seleção da Bielorrússia?
Quando surgiu o convite já estava no país há quatro anos. Já falava a língua, falo russo, estava adaptado ao país e via que as pessoas gostavam de mim. Foi através de um treinador que estava na seleção de sub-23, que posteriormente assumiu a seleção principal. Ele gostava do meu futebol, fez-me o convite e achei que também era uma oportunidade interessante. Por mais que a gente acredite no nosso potencial sabemos que é muito difícil chegar à seleção brasileira, nem dá para falar da concorrência. Também pensei que poderia jogar num Mundial…. Acabei por jogar nas Olimpíadas em 2012. Foi uma oportunidade que tive e achei que devia tomar essa decisão.

Sentiu-se logo mais valorizado a partir do momento em que passou a ser um jogador internacional?
Sim, com certeza. Um jogador internacional, de qualquer seleção do mundo, é mais respeitado e acho que só foi bom para a minha carreira.

Soma 27 internacionalizações, sendo três nesses Jogos Olímpicos de 2012 nos quais marcou um golo, curiosamente ao Brasil. Como foi essa sensação?
Na hora do jogo nem pensamos muito nisso, mas uns dias antes do jogo, e antes do começo do jogo, passou o filme da minha carreira pela cabeça. Pensava sobretudo na família e nos amigos que estavam a ver o jogo. Moro numa cidade pequena no Brasil e praticamente a cidade toda acompanhou o jogo. E eu pensava muito nisso. Quando marquei o golo passou-me tudo pela cabeça, principalmente a família e os amigos. Mas dentro de campo fui profissional, tentei respeitar o lado da Bielorrússia porque foi o país que me deu a oportunidade de estar numa competição como aquela. Mas foi isso: pensei nos familiares e nos amigos, mas na hora do jogo, amigos, amigos, negócios à parte! [risos]

Chegou a Portugal com 25 anos. Veio com o objetivo de depois saltar para uma liga mais atrativa ou não fez esse tipo de planos?
Quando saí do Astana para o Rio Ave fui receber muito menos dinheiro, três ou quatro vezes menos, mas era a oportunidade de dali tentar dar o salto para um grande de Portugal ou para outra liga. Infelizmente acabou por não acontecer, mas fiz tudo, tentei chegar a esse nível. Também não posso reclamar porque as coisas têm corrido bem na minha carreira, por mais que eu ache que fique aquele gostinho de algo mais, mas quando cheguei a Portugal pensei pouco no lado financeiro e mais na carreira. E também pelo lado familiar porque já pensávamos ter um filho. Portugal e a Europa Central é totalmente diferente do Leste europeu, não que lá fosse mau, mas era totalmente diferente, e foi por essas duas coisas: o lado profissional e familiar.

Cumpriu a quarta época no futebol português. Qual foi a mais marcante?
Foram todas de aprendizagem. Na primeira fomos à Liga Europa, no segundo ano deixámos o Rio Ave no sexto lugar, no ano passado cheguei ao Chaves e houve aquele jogo das meias-finais da Taça de Portugal que ficou marcado. Aqueles dois jogos contra o Vitória marcaram-me bastante pelo lado negativo, por não termos chegado à final. Teve o lado positivo de termos conseguido uma reviravolta, mas o futebol tem disso. E esta época também foi marcante, fizemos uma campanha histórica para o Chaves, com a melhor classificação de todos os tempos. Infelizmente faltou um pouco para o quinto lugar. Todas as épocas tiveram coisas interessantes.

Qual foi o melhor jogador com quem jogou em Portugal?
Na mesma equipa? Joguei com vários bons jogadores. O Cássio na baliza é muito bom. É meu amigo e é muito bom, tem comprovado isso ao longo destes anos em Portugal. O Marcelo é dos melhores centrais, tanto que agora vai para o Sporting. Também é meu amigo e um jogador marcante. Tive o Postiga no Rio Ave, outro jogador que dispensa comentários. Joguei com muitos bons jogadores no Chaves, mas há um que joga na minha posição e com quem gosto muito de jogar, que é o Tiba. Completamo-nos bastante, falamos a mesma língua dentro de campo e destaco o Tiba porque jogamos no meio-campo e nos entendemos muito bem.

Nas férias regressa ao Brasil. Quando volta a Portugal, o que é que faz questão de trazer sempre na mala?
Sinceramente não levo muitas coisas porque em Portugal encontramos tudo. O que levo são as minhas Havaianas porque em Portugal são bastante caras! Tudo o resto encontramos em Portugal, seja um pouco mais caro ou barato do que aqui, mas não há necessidade de levar.

Que opinião tem sobre o trabalho do Sindicato dos Jogadores no futebol português?
Até hoje nunca precisei de nada do Sindicato, mas pelo que vejo e oiço dos outros jogadores tem um trabalho bastante importante no futebol português. Têm havido muitas polémicas e o Sindicato tem defendido bastante os jogadores. Espero nunca precisar dos vossos serviços, mas caso seja preciso alguma coisa sei que vão fazer um bom trabalho. O trabalho está a ser muito bem feito, espero que continue assim e que essas polémicas parem. Portugal é um país muito bonito, com um futebol muito bonito e não precisa dessas coisas.


Perfil
Nome: Renan Bardini Bressan
Data de nascimento: 3 de novembro de 1988
Posição: Médio
Percurso como jogador: Atlético Tubarão (Brasil), Gomel (Bielorrússia), BATE Borisov (Bielorrússia), Alania (Rússia), Astana (Cazaquistão), Rio Ave, APOEL (Chipre) e Chaves.