Reconhecer, rejeitar e reportar


O fenómeno dos resultados combinados (“match-fixing”) é, seguramente, o maior flagelo que o desporto enfrenta neste século. O futebol não está imune e, em Portugal, a “Operação Jogo Duplo” colocou a temática na ordem do dia.

Para haver viciação do resultado ou do normal desenvolvimento de um jogo é preciso que os intervenientes diretos, jogadores e/ou árbitros, aceitem fazer algo em campo, em benefício próprio ou de terceiros, através das apostas desportivas. O “match-fixing” aniquila a imprevisibilidade característica do jogo para garantir o retorno do investimento feito pelo apostador na ocorrência de determinado resultado, ou evento, quer no mercado de apostas regulado, quer no chamado mercado negro.

As organizações criminosas que promovem estas práticas à escala global aproveitam contextos de fragilidade humana, reconhecendo aqueles que, por exemplo, tenham adição ao jogo, ou dificuldades financeiras resultantes do incumprimento salarial e acumular de dívidas, abordando-os com dinheiro e promessas de resolução dos seus problemas.

As consequências para os jogadores envolvidos estão hoje bem determinadas na lei que criminaliza comportamentos antidesportivos e na regulamentação desportiva aplicável. Para além do quadro legal, a simples suspeita e consequente investigação a que o atleta é submetido pela (eventual) participação na viciação de resultados é suficiente para um estigma social que compromete sua carreira desportiva.

As sanções previstas para este tipo de prática, em especial a pena de prisão para o corruptor passivo, ou seja, aquele que recebe algo para dentro de campo manipular o resultado ou incidência do jogo, passou a ter o limite mínimo de 1 ano e máximo de 8 anos de prisão, agravado para 10 anos em função do valor recebido. A moldura penal não deixa dúvidas quanto ao fim anunciado da carreira desportiva.

Aceitar, nem que por uma vez, a participação na manipulação de resultados torna o jogador e toda a família vulneráveis à chantagem e ameaça permanente de organizações que têm, quase sempre, conexão a outras práticas criminosas como o tráfico humano, de droga, de armas ou terrorismo. Valerá a pena correr este risco?

Os jogadores abordados devem reconhecer o que está a acontecer e rejeitar de imediato qualquer envolvimento. Depois disso, é preciso denunciar, para que possam ser realizadas as diligências necessárias à identificação dos envolvidos e ao seu afastamento do futebol.

Nesse sentido, o Sindicato dos Jogadores e a Federação Portuguesa de Futebol desenvolveram uma plataforma de denúncia, no âmbito do projeto “Deixa-te de Joguinhos”, a que também se associou a Liga Portugal, a qual permite aos agentes desportivos reportar informações de que tenham conhecimento. Esta denúncia pode ser feita de forma anónima e a ela têm acesso, apenas, as autoridades policiais que darão início à investigação.