“Tenho orgulho em ter fundado uma associação no país mais perigoso do mundo”


Segundo o diretor executivo Carlos Puche, “o medo de exigir os direitos, com receio de represálias, e acordos para não serem contratados” são os principais problemas dos jogadores na Colômbia.

Quando foi criado o sindicato colombiano (Acolfutpro)?
A ideia nasceu no seio dos jogadores da seleção da Colômbia em outubro de 2003. Luis Garcia foi o seu porta-voz e pediram-me para concretizar este desafio. Formalmente, a Acolfutpro nasceu em 2004. Este ano cumprimos 10 anos de existência.

Qual é o cargo que ocupa no sindicato?
Desde a criação da Acolfutpro que sou diretor executivo. Fui escolhido por ser ex-jogador e advogado. Em 1997 propus ao Tribunal Constitucional uma Lei do Desporto, que foi aceite, na qual se reconhece a liberdade de trabalho para os futebolistas. Esta é uma falha similar à que acontece com Bosman. Um jogador sem contrato é livre para trabalhar, mas os futebolistas colombianos não o sabiam antes de a Acolfutpro os ter informado.

Quais as mudanças mais importantes que se registaram no futebol desde a sua chegada ao Sindicato?
As mudanças mais importantes que conseguimos têm a ver com os pagamentos de salários e prestações sociais relativas às pensões e à saúde. No caso de um clube não cumprir com os trâmites dos contratos, o jogador fica livre para poder trabalhar através de uma habilitação provisória ou de uma transferência internacional interposta pela FIFA. Os contratos têm uma duração máxima de três anos. Em geral, lutamos para que ao jogador de futebol sejam reconhecidos os mesmos direitos que a qualquer outro trabalhador na Colômbia e que a nossa profissão não seja regida por um regulamento unilateral imposto pela Federação colombiana.

De que se orgulha mais?
O meu maior orgulho é ter fundado uma associação no país mais perigoso do mundo para o exercício da atividade sindical. Enfrentando ameaças de morte e tentativas de encerramento da Acolfutpro, hoje em dia todos os jogadores estão filiados e finalmente aprenderam a exigir respeito pelos seus direitos. Em 60 anos de futebol profissional, isto nunca tinha acontecido.

Quais são os principais serviços prestados pelo Sindicato?
Presta-se assistência jurídica aos jogadores de forma a que garantam os seus direitos fundamentais face aos clubes. Mensalmente verificamos os pagamentos de salários e os descontos para a Segurança Social. Caso algum clube não cumpra com as suas obrigações no prazo de 60 dias, procedemos imediatamente ao pedido de sanções ao Ministério do Desporto, procurando que o clube não possa competir até que cumpra com aquilo que lhe é devido. Temos acordos comerciais com várias empresas que oferecem produtos desportivos aos jogadores. Temos também um acordo com a associação de treinadores argentinos que facilite o acesso de jogadores aos cursos de técnico de futebol com descontos. Hoje em dia, temos 70 jogadores perto do final do seu primeiro ano. Temos uma equipa de jogadores sem contrato que opera nas cidades de Cali e em Medelín. Estas são as cidades da Colômbia em que se encontra o maior número de futebolistas profissionais.

Quais são os principais problemas que afetam os jogadores na Colômbia?
Considero que existe muito medo de exigir os direitos, com medo de represálias, bem como acordos para não serem contratados.

O problema do narcotráfico chega ao futebol colombiano?
Nos anos 80, o narcotráfico apoderou-se da maioria dos clubes colombianos. Esta situação tem vindo a melhorar. Graças a uma lei de 2011, em cuja construção participámos, criou-se a possibilidade para que os clubes se convertessem em sociedades anónimas, com exigências de manutenção de capital líquido, assim como o cumprimento e obrigações fiscais e laborais e outras medidas de controlo sobre os clubes. Hoje em dia, os clubes são considerados verdadeiras empresas desportivas com transparência e controlo sobre as suas atividades.

Os salários em atraso são um problema no futebol colombiano?
Até à entrada da lei que mencionei há pouco, eram um problema. Desde então, os salários são cumpridos e hoje em dia apenas um clube, de entre 36, está em dívida para com as suas obrigações para com os futebolistas. Esta situação fez crescer e fortalecer o nosso sindicato.

Têm alguma ação dedicada a jogadores desempregados?
Além de dar a oportunidade de manutenção da condição física aos jogadores sem contrato enquanto não assinam, não possuímos ações específicas para futebolistas desempregados.

Como acompanha o trabalho da FIFPro e da FIFPro Divisão América?
A Acolfutpro faz parte do comité executivo da Divisão América e apoiamos assim todos os sindicatos da América. Também fazemos parte dos comités de regulação, financeiro e de futebol feminino da FIFPro. Assim como Joaquim Evangelista, sou árbitro da Câmara de Resolução de Disputas da FIFA, onde defendemos os direitos dos futebolistas.

Qual é a sua opinião sobre o trabalho do SJPF?
Considero que o SJPF, assim como nós, luta convictamente pelos direitos dos futebolistas. Sabemos, pelo que dizem os colombianos que jogam em clubes portugueses, que existem problemas e atrasos nos salários, acrescido à situação económica crítica que o país atravessa e que afeta o futebol.

Quer deixar uma mensagem aos jogadores colombianos que jogam em Portugal?
Peço aos jogadores colombianos que apoiem e trabalhem com o SJPF. Esta é a única maneira de defender coletivamente os direitos de todos os futebolistas. Essas experiências poderão ser replicadas na Colômbia ou em qualquer país onde trabalhem. Qualquer que seja o lugar onde joguem, unam-se ao sindicato para que possam exercer a vossa profissão de uma forma digna.

Nome: Carlos González Puche
Local de nascimento: Bogotá, 1958
Clubes: Millionarios, America de Cali e Cúcuta Deportivo