“Numa escala de 0 a 5, a arbitragem portuguesa está muito perto do 4”
JOÃO CAPELA, árbitro da Associação de Futebol de Lisboa, diz que a arbitragem portuguesa está no bom caminho e que é necessário apostar nos jovens e nas relações entre classes no futebol.
Qual é o estado da arbitragem em Portugal?
A arbitragem portuguesa encontra-se numa fase de transição de um modelo amador para um modelo profissional, pelo que o estado atual é de enorme expectativa e esperança numa evolução positiva de todo o setor, potenciando desempenhos de excelência. A nível internacional, estamos na melhor fase de sempre da arbitragem portuguesa, continuamos a merecer a confiança da UEFA e da FIFA para estar presentes nas fases finais das competições mais importantes a nível europeu e mundial. Aproveito para desejar toda a sorte do Mundo à equipa de arbitragem designada para estar no Brasil (Pedro Proença, Bertino Miranda e Tiago Trigo), assim como à nossa Seleção e toda a estrutura que a acompanhará.
Faz mais de um ano que a arbitragem passou da Liga para a FPF. O balanço é positivo?
Esta passagem já era uma realidade há muito desejada pelo setor, até para cumprir com os requisitos internacionais. No início, todos os processos de mudança têm pontos positivos e negativos, pelo que este não é diferente. Ao longo do tempo, o setor da arbitragem (Conselho de Arbitragem, APAF e os árbitros), juntamente com o total envolvimento e apoio de Fernando Gomes, têm feito um esforço para que esta mudança decorra da melhor forma, o que tem vindo a acontecer, pelo que considero que o balanço é positivo.
Entretanto a profissionalização dos árbitros entrou em vigor e o João Capela é um dos nove árbitros profissionais. Satisfeito com esta medida? De que forma vai melhorar ainda mais a sua arbitragem?
Extremamente satisfeito e honrado em fazer parte deste grupo inicial. É óbvio que estão a ser criadas as condições para que este grupo tenha mais condições para evoluir, potenciando ainda melhores arbitragens. Mas é necessário entender que esta mudança positiva não chega, é necessário que externamente sejam criadas condições para que o futebol, e todos os seus agentes desportivos, acompanhem esta evolução, valorizando o desporto-rei pelo lado positivo.
Numa escala de 0 a 5 que nota daria à arbitragem portuguesa?
As avaliações dependem sempre do ponto de vista do avaliador, de vários indicadores, de qual o setor ou desempenho específico se quer avaliar, mas considerando todos no global, diria que estamos muito perto da nota 4.
Na sua opinião, quais são os grandes desafios da arbitragem e que medidas devem ser implementadas para melhorar o setor?
O grande desafio da arbitragem é o futuro, mais precisamente a captação e formação de árbitros jovens. Já estão a ser implementadas algumas medidas, como por exemplo a Academia de Arbitragem, mas na minha opinião, a grande dificuldade atual é o acompanhamento dos árbitros jovens, pois apesar de haver um número aceitável de "novos" árbitros, quase 50 por cento deixam a atividade ao fim dos primeiros três anos. Deveriam ser desenvolvidas estratégias de acompanhamento e gestão destes recursos humanos valiosos.
É a favor da introdução das novas tecnologias no futebol?
Sim. A tecnologia "goal-line" é um exemplo muito positivo. O problema é que estas tecnologias são muito dispendiosas e nem todas as competições nacionais têm capacidade financeira para as suportar.
Como analisa a relação entre as associações de classe (árbitros, jogadores e treinadores)?
Daquilo que tenho conhecimento, essa relação é escassa, para não dizer quase nula, o que não é positivo. Considero que se deveria fazer um esforço para que essa relação fosse efetiva, juntando os dirigentes e o adepto. Afinal o futebol é de todos e para todos, apesar de muitas vezes não parecer.
Como tem visto a atuação do SJPF no futebol português?
Uma atuação positiva da defesa dos direitos dos jogadores e no apoio aos que infelizmente se encontram desempregados e que merecem uma palavra de incentivo.
Como é que deve ser uma relação árbitro/jogador?
Acima de tudo de respeito. O objetivo dos árbitros é que os jogadores aceitem o homem que está a arbitrar, não têm de concordar com todas as decisões, mas têm de as aceitar e se isso acontecer, é meio caminho para que a relação de respeito se mantenha inalterada.
Ao longo dos anos tem notado se os jogadores têm mudado o seu comportamento para com os árbitros?
Como os árbitros, também os jogadores têm que lidar com a pressão e isso influencia os nossos comportamentos no desempenho da nossa função. Nota-se que cada vez mais os jogadores têm evoluído nesse sentido, e tal como os árbitros, a maior parte deles já sabe se controlar emocionalmente. Tenho constatado que, mais uma vez como árbitros, os jogadores que conseguem controlar mais as suas emoções, focalizando-se na sua tarefa, têm melhores desempenhos.
Seria positivo que todos os clubes tivessem na sua estrutura ex-árbitros para auxiliarem jogadores, técnicos e dirigentes?
Isso depende sempre do objetivo dessa função na estrutura e das capacidades que esse ex-árbitro tem para a desempenhar. Como referi anteriormente, considero que se houvesse um maior envolvimento entre todos os agentes desportivos no ativo, o futebol ganhava outra dimensão.
Ser árbitro é uma atividade apelativa para os jovens?
Sem dúvida nenhuma, não só pelo que se pode alcançar desportivamente e financeiramente, mas principalmente pelas competências e valores que se conquistam, tais como, responsabilidade, espírito de equipa, capacidade de liderança, controlo emocional, etc... que vão ser importantíssimas para a sua vida pessoal, familiar e profissional.