“Os árbitros devem pautar-se pela discrição”


A profissionalização da arbitragem.

Após 20 anos nos relvados, Bruno Esteves coloca a arbitragem nacional no pódio europeu e acredita que com a profissionalização e a criação da Academia o sector só pode melhorar.

Estreou-se na I Liga num Estrela da Amadora-Rio Ave, em 2009. O que recorda desse encontro?
Recordo-me de sentir uma ansiedade natural. Contei com a aju­da do meu amigo Bruno Paixão como quarto árbitro, o que me fa­cilitou a tarefa. Lembro-me de uma conversa com os delegados dos clubes, onde referi que aqueles emblemas ficariam na mi­nha "história". E lembro-me de expulsar um jogador do Rio Ave, o André Vilas Boas, e até já nos rimos ao relembrar esse episódio.

Ser árbitro é apelativo para os jovens?
Apesar do aumento da exigência nos últimos anos, observou-se uma diminuição da média de idades no sector. Considero que a função de árbitro é hoje apelativa para os jovens, sendo encarada por muitos como uma possibilidade de carreira e de futuro.

A Academia vai fazer a diferença no futuro?
Sim. Foi colocada em prática para "criar" árbitros de craveira mundial. É um projecto que já trouxe resultados e julgo que se­rão ainda mais significativos. Coloca à disposição dos árbitros um conjunto de ferramentas importantes. Terá de fazer a diferença.

A profissionalização melhorou o sector?
Como sabe, não sou árbitro profissional, nem tenho um conheci­mento profundo de como se trabalha nos pólos profissionais. No entanto, tenho consciência de que ser profissional num sector é diferente de ser amador e quem dispõe de mais tempo, mais ferramentas e mais apoio tem necessariamente de ser melhor.

Consegue conciliar a arbitragem com o seu trabalho?
Faço 20 anos de árbitro e 19 como profissional na mesma em­presa. Sempre fui muito dedicado às duas vertentes e talvez por isso elas não se incompatibilizem. Os meus superiores hierárqui­cos entendem e aceitam qualquer pedido que lhes faça, quando a incompatibilidade aparece. Sou um privilegiado nesse aspecto.

Quais são os grandes desafios da arbitragem e que me­didas devem ser tomadas para melhorar o sector?
A arbitragem tem sempre aspectos em que pode evoluir. Os nos­sos gestores desempenham a sua actividade com o objectivo de uma melhoria contínua do trabalho, não só dos árbitros, mas dos diversos agentes de arbitragem, no sentido de estes valorizarem as nossas competições. Aliás, um dos lemas deste quadro de ár­bitros é o de "garantir a imparcialidade e valorização do futebol.”

Os árbitros também deviam falar no final dos jogos, como fazem os jogadores e os treinadores?
Não creio que esse testemunho trouxesse alguma mais-valia ao futebol. Acredito que os árbitros devem pautar-se pela discrição. No entanto, nas finais das grandes competições, como são os casos da Taça de Portugal e da Taça da Liga, aprecio o modo como as equipas de arbitragem são integradas no evento e que antes do jogo tenham a oportunidade de projectar o mesmo.

De 0 a 5, que nota daria à arbitragem portuguesa?
Sinceramente, não vejo arbitragens superiores. Temos dos me­lhores jogadores do Mundo e uma Liga competitiva. Os desem­penhos dos nossos árbitros são normalmente positivos. Atribuir nota não é elegante, no entanto considero que estamos no pódio europeu.

Nos seus jogos já viu jogadores talentosos ao ponto de querer sentar-se na bancada a assistir?
Tantos e tantos que não consigo enumerar, nem tão pouco me atrevia, não fosse esquecer algum. De facto, dentro de campo, não conseguimos desfrutar de tal talento e, sim, é verdade, por vezes apetece estar de fora e assistir a tantos e fantásticos de­sempenhos que verificamos nos nossos relvados.

Ainda ambiciona chegar a internacional?
É um patamar que não alcancei e que será muito difícil de se concretizar devido à minha idade.

Seria positivo que os clubes integrassem ex-árbitros?
Todos os agentes são importantes numa estrutura profissional e o árbitro não pode ser excluído. Os clubes que tenham essa ousadia não ficarão defraudados. Muitas pessoas desconhecem, mas muitos árbitros têm curso de treinador e de variados níveis.

O árbitro é o elo mais fraco do futebol?
O árbitro detém poderes que mais ninguém tem num jogo de futebol e dos que tem mais responsabilidade nas suas acções. Naturalmente que entendo a sua pergunta, mas aos poucos esse conceito tem vindo a dissipar-se. O árbitro é cada vez mais um elemento participativo e respeitado no jogo.

É a favor das novas tecnologias no futebol?
O objectivo dos árbitros é a verdade desportiva e tudo o que puder ser uma ferramenta que ajude a eliminar o factor "erro" resultante das decisões de facto (aquelas que resultam de uma má apreciação ou visão) será bem recebido pela arbitragem.

Como tem visto a actuação do SJPF?
Tem a preocupação de proteger a competição e o jogador. Em termos de inclusão no mercado de trabalho tem feito um serviço meritório, nomeadamente para o jogador que, por infortúnio ou fim de carreira, procura uma solução de vida e uma alternativa.


Perfil
Nome: Bruno Alexandre da Silva Esteves
Data de nascimento: 27 de Novembro de 1977
Associação: Associação de Futebol de Setúbal
Estreia na Primeira Categoria: 2008.