O capitão da Vitória


Vasco Fernandes é o capitão do Vitória de Setúbal, mas é também o capitão da vitória porque odeia perder.

Mereceu a braçadeira de capitão. Como foi eleito para o cargo?
Foi na época passada, com o míster Couceiro. Tínhamos um leque de quatro capitães e quando cheguei, há dois anos, foi eleito um quinto, que fui eu. Entretanto, três saíram e ficou só o Frederico Venâncio e eu, como segundo. Nos últimos dias de agosto, o Frederico também foi vendido e, consequente, subi a capitão. Foi assim: pela hierarquia e pelas características que o míster achava serem as mais indicadas para ser o cargo.

Já tinha sido capitão noutros clubes?
Sim. No Olhanense também tinha feito parte do grupo dos capitães.

Sente que impõe uma liderança natural?
Acho que isso são coisas naturais, de cada um e, como sou uma pessoa comunicativa, gosto de incentivar, tento ajudar os colegas e puxo pela equipa. Como também sou muito competitivo dentro de campo, odeio perder, consigo dar-me bem com todos os companheiros. Reunindo essas características, o míster achou que era o mais indicado para ser capitão. Mas é uma coisa natural e que faço sem qualquer tipo de esforço. Pelo contrário, é um prazer e um orgulho.

Tem algum capitão como exemplo?
Comecei muito novo. Com 16 anos era profissional no Olhanense e encontrei gente muito mais velha do que eu, já na fase final da carreira, como o Jorge Amaral, o Edinho, o Rui Loja, o Miguel Teixeira…. Era gente muito experiente e com o tempo passei a vê-los como referências. Era um miúdo atento e observador, os tempos eram outros, mas a forma como eles lideravam e viviam aquilo ficou como referência.

Que valores transmite aos mais jovens e a quem chega ao clube?
Pertencemos a um clube histórico, onde passaram grandes jogadores e treinadores, e temos essa responsabilidade, que é diária. Tento transmitir que representamos uma cidade, uma região, e temos de ser auto-exigentes para tentar corresponder às expetativas da grandeza da instituição. É um clube com troféus, com muitas participações na Primeira Liga, e eu e os restantes capitães tentamos transmitir isso aos mais novos e aos que chegam.

Como capitão, alguma vez precisou de chamar um colega à atenção de uma forma mais dura?
Sou uma pessoa muito comunicativa, estou sempre a chamar a atenção, mas de uma forma positiva, para estarmos alerta e concentrados. Faz parte das minhas características. Estou sempre a falar, nos treinos e nos jogos. Acho que também não sou ninguém para estar a repreender negativamente. É mais naquele espírito positivo de não perdermos o foco, seja em que exercício for ou seja em que jogo for.

E naquelas situações como uma entrada mais dura num treino? Já teve de intervir e acalmar os ânimos por ser o capitão?
São situações normais e, quando acontecem, há sempre uma intervenção rápida dos companheiros. Muitas vezes nem estás perto e, por mais que possas gritar, se aquilo está quente, é difícil ouvirem-te. Mas já me aconteceu acalmar os ânimos e, mais do que isso, tentar transformar uma situação negativa numa positiva. Quando já estamos no balneário, no nosso espaço, tentar levar aquilo para a parte mais divertida. Obviamente que nunca há diversão, mas tentar tirar pressão à situação.

Do que é que os capitães costumam falar quando trocam galhardetes?
Como sabes, há equipas que vão tirar a foto, outras não, mas há sempre um dos capitães que espera pelo outro. Normalmente é o que sai no momento, são coisas que ficam ali. Os árbitros também já nos conhecem, já são alguns anos de relação, tentas sempre que aquilo seja o menos demorado possível porque estás ali parado, à espera. E tentamos relativizar ao máximo a situação antes da competição a sério porque depois do apito a conversa já é outra e esquecemos as amizades. Mas é sempre bom encontrar ex-companheiros e amigos nessas situações.

E costuma haver algum tipo de picardia saudável com o outro capitão? Algumas bocas na brincadeira?
Não. Isso o mais normal é, se tiveres uma relação estreita com outro jogador, trocares umas mensagens na semana anterior ao jogo, mas ali já não é tanto para a brincadeira. O nível de concentração e seriedade já está no máximo. Podes trocar umas palavras só para não estares ali calado à espera, mas nada na brincadeira. É mais para passar o tempo do que outra coisa.

Os árbitros costumam ser mais tolerantes com os protestos dos capitães?
Não penso. Acho que a arbitragem evoluiu nesse sentido, principalmente em Portugal. Os árbitros são muito mais comunicativos. Lembro-me que quando comecei era mais difícil. Hoje falamos, muitas vezes até exaltados, mas sempre com respeito e não há grande diferença em que seja o capitão. Vejo colegas meus também já experientes, que já os conhecem há muito tempo, e também têm esse tipo de relação com os árbitros. Acho que isso foi um bom passo que a arbitragem portuguesa deu. São muito mais comunicativos e abrangentes na relação com os jogadores.

Alguma vez foi expulso por palavras enquanto capitão?
Por palavras não. Já fui expulso, mas por palavras diretamente ao árbitro nunca me aconteceu. Posso ter visto um amarelo por isso, mas nunca fui expulso por palavras. Mais do que palavras, eles não toleram gestos. Se gesticulas muito os braços....

Jogou em França, Espanha, Grécia e Roménia. Jogar no estrangeiro era um objetivo?
Joguei em cinco países, contando com Portugal, e sempre tive essa ambição. No futebol as coisas vão-se proporcionando, umas vezes esperas, noutras são inesperadas, mas sempre quis conhecer outras realidades, culturas e idiomas, enriquecer-me como jogador e como pessoa. No estrangeiro passas por situações que seriam impensáveis no teu país e sempre o quis fazer. Tive a felicidade de viver em países espetaculares. Foram experiências muito enriquecedoras.

Como tem visto a atuação do Sindicato dos Jogadores no futebol português?
Sem dúvida que temos de dar um mérito muito grande tanto ao Dr. Joaquim Evangelista como ao Sindicato, aos juristas e aos delegados, porque as coisas melhoraram a 300 ou 400%! Lembro-me que quando comecei era muito mais difícil. Os jogadores tinham muito menos força do que hoje e conseguir alterar com tanta ajuda do Sindicato foi uma coisa que me alegra. É isso que também tento transmitir aos jogadores novos que chegam: é importante fazer parte do Sindicato porque quantos mais formos mais força temos. É uma instituição consolidada e respeitada no nosso país devido ao trabalho realizado nos últimos anos, sem dúvida.


Perfil
Nome: Vasco Herculano Salgado Cunha Mango Fernandes
Data de nascimento: 12 de novembro de 1986
Posição: Defesa
Percurso como jogador: Olhanense (formação), Bordéus B (França), Olhanense, Salamanca (Espanha), Leixões, Celta de Vigo (Espanha), Elche (Espanha), Olhanense, Platanias Chania (Grécia), Aris (Grécia), Pandurii (Roménia) e Vitória de Setúbal.