“Cada dia que passa é para ser vivido e não desperdiçado”
João Godinho, guarda-redes do Mafra, tem passado os dias na companhia da namorada e da filha.
João Godinho, guarda-redes e capitão do Mafra, tem passado os dias na companhia da namorada e da filha de nove anos, de forma tranquila. Sente que a maior dificuldade passa por não fazer o treino a que estava habituado e acredita que, depois disto, vamos dar mais valor àquilo que realmente importa.
Vivemos uma fase única nas nossas vidas. Como é que tens passado os dias?
Tenho estado em casa, só saio mesmo para aquilo que é essencial, como ir ao supermercado e dar umas corridas de vez em quando porque faz parte do treino individual que temos para fazer. Procuro refugiar-me num sítio aqui perto de casa onde não há muita gente para ir dar umas corridas e, de resto, tenho estado em casa com a minha namorada e com a minha filha.
Como é que as coisas estão a ser vividas na tua área de residência? Houve alguma situação excecional?
Não. Penso que até agora não há nada de alarmante. Moro nos arredores de Lisboa e, até agora, está tudo tranquilo. Limito-me a aguardar para ver o desenrolar desta situação, com a expetativa de voltarmos aos treinos o mais rápido possível.
No teu caso, sendo guarda-redes, uma posição com um treino específico, essencialmente tens corrido ou também treinas com bola?
Temos de encontrar soluções para fazer um treino mais próximo da realidade de um guarda-redes. Torna-se um pouco difícil fazer alguns exercícios mais específicos, até porque envolvem quedas e outras situações que não podemos treinar em casa. A corrida é mais para tentar manter a forma física, para suar um pouco, mas a maior dificuldade tem sido mesmo essa, de tentar fazer exercícios que vão ao encontro daquilo que costumamos fazer como guarda-redes.
"A MAIOR DIFICULDADE TEM SIDO MESMO ESSA, DE TENTAR FAZER EXERCÍCIOS QUE VÃO AO ENCONTRO DAQUILO QUE COSTUMAMOS FAZER COMO GUARDA-REDES."
Quando não estás a treinar, como é que ocupas o tempo?
Parte do tempo passo com a minha filha, a fazer coisas com elas, mas também com a minha namorada, a ver séries, filmes, a ouvir música, que é uma coisa que gosto muito de fazer, e nada mais. Em casa também não podemos fazer muito mais. Tenho aproveitado para estar com elas e fazermos algumas coisas juntos.
Que idade é que tem a tua filha?
Tem nove anos.
Como é que lhe explicaste este momento que estamos a passar?
No início não foi fácil ela perceber, mas, com o passar do tempo, ao ver que era geral, depois de falar ao telefone com as amigas, que também estão em casa, na mesma situação, acabou por perceber. É difícil manter uma criança em casa, mas até agora está a portar-se muito bem. Tentamos sempre encontrar novas soluções para ela estar distraída. Faz com que nós também estejamos distraídos e que o tempo passe um pouco mais rápido.
Falas diariamente com a tua família, nomeadamente com pais e avós?
Sim. Moramos perto e falo regularmente para saber como estão, se precisam de alguma coisa, principalmente os meus avós. Sempre que vou ao supermercado também trago coisas para eles. São pessoas que estão habituadas a estar em casa e quando saem tratam logo de tudo o que têm para tratar. Felizmente, por enquanto, está tudo a correr bem.
E falas regularmente com os teus colegas de equipa?
Sim, também. Falamos sempre pelo WhatsApp, no grupo da nossa equipa. Também fazemos um treino em conjunto por videochamada uma vez por semana e mantemos o contacto. No Mafra temos muitos jogadores que são do Norte, agora estão lá com as famílias, e não há problemas com nenhum deles. Está tudo tranquilo.
Sentes que, apesar da distância física de família e amigos, acabamos por estar mais próximos agora?
Penso que sim. Das poucas coisas positivas que podemos retirar desta situação é que muitas vezes, com os trabalhos, que ocupam grande parte do dia, passamos pouco tempo com os nossos em casa, principalmente com os filhos, que estão na escola, e com as mulheres, que estão a trabalhar. E agora, como estamos mais tempo juntos, esse é um dos aspetos que temos de aproveitar.
Já sentiste alguma ansiedade ou tens lidado bem com o lado psicológico?
A parte psicológica claro que é difícil, mas onde acho que se nota mais é no aspeto físico. Estamos habituados a um esforço e a uma rotina diária, o nosso corpo está habituado àquela intensidade de treino e parece que às vezes nos pede para fazermos mais alguma coisa, começa a ressentir-se dessa falta de esforço. Temos de nos manter ativos o máximo que conseguirmos.
És crente? A fé tem-te ajudado a superar este momento?
Não. Não tenho esse lado muito ativo.
Temes que seja possível voltarmos a passar por uma situação parecida?
É possível. Há uns tempos nunca pensaríamos que seria possível estarmos a viver esta situação, mas, na realidade, um “simples” vírus conseguiu paralisar o mundo inteiro. Temos de estar em alerta constante porque a qualquer momento pode acontecer alguma coisa que nos faça parar de novo. O mundo está a tentar reagir da forma possível a esta situação e penso que vamos ultrapassar rapidamente isto.
Descobriste alguma qualidade que não sabias que tinhas?
Muita paciência! [risos] A paciência é uma delas. Tenho-me mantido tranquilo. A família é muito importante nestes momentos e penso que estamos a ultrapassar isto bem.
Decidiste mudar alguma coisa futuramente? Alguma resolução pós-isolamento?
Não. Penso que será importante fazermos aquilo de que mais gostamos sem perder muito tempo com outras coisas. Por vezes desfocamos um pouco e damos importância a coisas que realmente não interessam. É isso que temos de retirar: cada dia que passa é para ser vivido e não desperdiçado. É isso que temos de fazer daqui para a frente.