“Vou dar muito mais valor à minha liberdade”


João Pedro, médio do Tondela, tem vivido a quarentena em Viseu, com a mulher, mas longe dos pais.

João Pedro, médio do Tondela, tem vivido a quarentena em Viseu, com a mulher, mas longe dos pais, que estão em Guimarães e continuam a trabalhar. Preocupa-se com os amigos que deixou nos Estados Unidos e com uma segunda onda da pandemia, o que faz com que agora comunique mais com aqueles que ama. E pode ser que surja um investidor nato na Bolsa.

Vivemos uma fase única nas nossas vidas. Como é que tens passado os dias?
Tem sido difícil. Tenho estado em casa, só saio para ir comprar os bens essenciais e tenho ido mais ou menos de dez em dez dias. De resto, tenho estado sempre em casa, a cumprir a quarentena.

Tens treinado todos os dias?
Agora entrámos num período de férias, mas tenho treinado regularmente, com folgas ao fim-de-semana. Estava neste momento a fazer bicicleta e não tenho descurado os treinos. Segundo as indicações que tenho, o campeonato vai mesmo continuar e o tempo de preparação para os primeiros jogos não vai ser muito, então não me posso descuidar muito.

Quando não estás a treinar, como é que ocupas o tempo?
Tenho lido livros, vejo séries e filmes, jogo PlayStation…. Tem sido basicamente isso.

Como é que as coisas estão a ser vividas na tua área de residência?
Moro num apartamento em Viseu e as coisas aqui estão muito tranquilas. As pessoas estão a respeitar a quarentena. As que vejo na rua estão a passear cães ou a dar uma volta com os filhos, às vezes também é preciso para as crianças desanuviarem um bocado, mas noto que as pessoas têm estado em casa.

Vives sozinho?
Vivo com a minha mulher.

Viveste nos Estados Unidos, onde a situação está realmente dramática. Tens conhecimento de algum antigo colega que esteja a viver o drama da pandemia?
Tenho falado com alguns amigos que fiz nos Estados Unidos e eles têm-me dito que está realmente mau. Ainda hoje falei com uma pessoa que vive na Califórnia e lá obrigam as pessoas a usarem máscara na rua, caso contrário são multadas em mil dólares. As medidas de restrição estão mesmo apertadas por lá. A situação deles é bem pior que a nossa e é esse o feedback que me têm dado.

 

“TENHO FALADO COM ALGUNS AMIGOS QUE FIZ NOS ESTADOS UNIDOS E ELES TÊM-ME DITO QUE ESTÁ REALMENTE MAU”

 

Falas diariamente com a tua família, nomeadamente com pais e avós?
Falo com os meus pais diariamente, avós só tenho um. Estão em Guimarães, na freguesia de Vermil. A minha mãe está a trabalhar, o meu pai foi agora mandado para layoff mas tem ido à fábrica fazer alguns trabalhos e essa foi uma das razões que fez com que eu e a minha mulher ficássemos em Viseu. Tanto os meus pais como os pais dela ainda estão a trabalhar e não seria uma grande quarentena se fossemos para cima e estivéssemos em contacto com eles. Íamos estar sujeitos à contaminação caso eles também tivessem e decidimos ficar aqui. Mas falamos todos os dias com eles e com a minha irmã e está tudo bem.

E falas regularmente com os teus colegas de equipa?
Sim. Temos o grupo do plantel [no WhatsApp]. Não falamos todos os dias, mas falamos muitas vezes, fazemos as nossas brincadeiras, e, pelo que tenho visto, toda a gente tem cumprido. E ainda bem, porque só assim se resolvem as coisas.

Sentes que, apesar da distância física de família e amigos, acabamos por estar mais próximos agora?
Possivelmente, sim. As dificuldades fazem surgir esta união, preocupamo-nos mais, o que é normal. Acho que nunca falei tanto com a família e os amigos como agora porque a necessidade de saber se está tudo bem é maior.

Já sentiste alguma ansiedade ou tens lidado bem com o lado psicológico?
Tenho lidado bem. Claro que preferia estar a viver a minha vida normalmente. Por norma sou uma pessoa caseira, gosto de ficar em casa, mas uma coisa é ser caseirinho e ter a possibilidade de ir lá fora tomar um café, ir ao cinema, ir onde quiser à vontade, outra coisa é ter mesmo de ficar em casa como se fosse uma prisão. Tenho lidado bem, mas é complicado.

És crente? A fé tem-te ajudado a superar este momento?
É um meio-meio. Não acredito na Igreja, mas acredito nos meus familiares que já partiram. É a eles que peço força, mesmo antes de entrar em campo, peço que estejam ao meu lado, mas não acredito na Igreja. Levo muito na cabeça da minha mãe por causa dessa minha opinião, mas é assim que vivo a minha crença.

Temes que seja possível voltarmos a passar por uma situação parecida?
Acho que uma segunda onda vai ser inevitável até vir a vacina, porque as pessoas vão voltar mais ou menos às vidas normais e aí o contágio vai ser muito mais perigoso. Corremos esse risco e os especialistas também falam nessa segunda onda. Tenho algum receio, mas também não podemos estar sempre em casa e viver com medo, senão vamos morrer da cura.

Descobriste alguma qualidade ou defeito que não sabias que tinhas?
Não, continua tudo igual. Sou uma pessoa muito caseira, por norma já costumava estar em casa. Não descobri nada de especial a não ser a minha veia de investidor na Bolsa, mas está a ser difícil. [risos] Estou a tentar aprender algo sobre isso, mas não é fácil. Usam-se muitos termos económicos que não conheço e tenho de pesquisar. É uma maneira de passar o tempo também.

Decidiste mudar alguma coisa futuramente? Alguma resolução pós-isolamento?
Não, simplesmente vou dar muito mais valor à minha liberdade. Acho que não vou mudar muito mais do que isso.