Entre a segurança alimentar e os areais


Von é campeão do mundo de futebol de praia e trabalha numa farmacêutica.

Para os colegas de faculdade e professores universitários é o João Gonçalves, mas para os amigos e no mundo do futebol de praia, apenas Von, uma alcunha que se deve ao irmão e a uma brincadeira de crianças, por ser fã da seleção holandesa nos videojogos, onde alguns jogadores iniciavam os nomes por Van. Para ser diferente, João ficou Von.

No primeiro ano de faculdade, João Gonçalves foi convidado por um amigo para treinar futebol de praia. A primeira impressão não foi positiva, mas acabou por singrar nos areais: “Ele tinha uma equipa amadora de futebol de praia, achava que eu ia gostar e convenceu-me a fazer uns treinos. Inicialmente não gostei muito e disse-lhe que provavelmente não queria voltar a jogar, porque a areia atrapalhava muito e era algo puxado, mas comecei a jogar assim que entrei na universidade.”

Von optou pela área científica, tendo concluído o mestrado em tecnologia e segurança alimentar, na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa. Atualmente trabalha na farmacêutica Hovione e é jogador da equipa de futebol de praia do Sporting, onde se sagrou campeão nacional em outubro deste ano.

Em 2019, o pivô de 25 anos atingiu o ponto mais alto da carreira no futebol de praia, ao ser campeão do mundo pela Seleção Nacional. Modalidade em franca expansão no nosso país, Von considera que hoje há jogadores que já conseguem viver exclusivamente da prática desportiva.

Von sente que o seu rendimento subiu quando decidiu conciliar a formação académica com a prática desportiva.

“O futebol de praia é uma modalidade muito particular, porque a maioria dos clubes não vinculam o jogador somente àquele clube. Podem jogar em Itália, Portugal e Rússia na mesma época, por exemplo, e isso significa que um jogador pode juntar algum dinheiro ao longo do ano. É possível viver só do futebol de praia, mas depois cabe ao próprio jogador decidir se é mais seguro ter outra atividade profissional, que é o meu caso”, revela o jogador da Seleção Nacional e do Sporting.

As carreiras duais são vistas pelos atletas portugueses com bons olhos, como é o caso de Von, que concilia o trabalho numa farmacêutica com o futebol de praia: “Sei que não é fácil conciliar as duas coisas, mas sempre quis ter um trabalho para ter uma segurança financeira, continuando a jogar futebol de praia ao mais alto nível. Vou tentar enquadrar as duas coisas na minha vida.”

Apesar das dificuldades, Von aconselha os atletas a não descurarem a vertente escolar, mas também a não abandonarem o desporto e explica o porquê: “O meu rendimento na faculdade e no desporto subiu quando comecei a integrar os estágios da Seleção Nacional e a treinar mais vezes por semana. Para quem não pratica desporto pode parecer estranho, mas a verdade é que quando estamos mais ocupados conseguimos organizar melhor o tempo e ficar mais focados no que temos para fazer.”

As carreiras duais são vistas com bons olhos pelos atletas: Von concilia o trabalho numa farmacêutica com o futebol de praia.

Tanto no Sporting como na Seleção Nacional, o campeão do mundo tem colegas que estão a estudar ou já têm uma formação superior: “O Joãozinho e o Tomás Seixas, do Sporting, estão a ajudar e penso que o Bruno Torres, da Seleção Nacional, é licenciado e trabalha num ginásio. Nesta modalidade há quem consiga viver só do futebol de praia, mas também há quem tenha outras profissões, a maioria relacionadas com o desporto.”

Sobre o Programa de Educação e Formação do Sindicato dos Jogadores, Von não tem dúvidas de que se trata de uma mais-valia para os atletas. “É muito importante haver essa preocupação porque toda a aprendizagem e formação é fundamental. Infelizmente há muitas pessoas que se veem obrigadas a abdicar de uma carreira desportiva quando já estão num patamar elevado, porque a maioria das empresas em Portugal procura pessoas que estejam disponíveis a 100%”, conclui.

Cinco anos depois de ter iniciado uma carreira no futebol de praia, Von dá os primeiros passos numa farmacêutica portuguesa, mantendo o foco no desporto de alto rendimento e na sua profissão.