"Quero desfrutar do futebol e aproveitar todos os momentos"
Lateral direito do Estoril cumpre a nona época nas competições profissionais portuguesas.
29 anos e já uma carreira com bastantes histórias. Comecemos pelo início. Fizeste a formação toda no FC Porto. Quando é que começa a tua vida no futebol?
Com oito ou nove anos fui aos treinos de captação do FC Porto com dois amigos. Na altura ainda era no pelado, na Constituição, ainda não era o Vitalis Parque de agora. Fui aos treinos, no final do primeiro chamaram-me para ir ao seguinte e assim sucessivamente, até que fiquei mesmo na equipa, nas escolinhas do Porto e fiz depois toda a minha formação lá.
Muitos jogadores vão passando por vários clubes e várias divisões, o que não aconteceu contigo. Como foi ser formado num dos ditos grandes de Portugal?
É sempre bom. Estamos ali, com as melhores condições do país, com os melhores treinadores para poder aprender o que é o futebol. Tive a felicidade de poder fazer toda a minha formação lá. Sou da cidade do Porto, vivia até perto da Constituição, portanto, foi sem dúvida um orgulho poder fazer toda a minha formação no FC Porto.
Estreaste-te enquanto sénior na Segunda Liga, pelo Trofense, emprestado pelo FC Porto. Era essa a estreia que imaginavas na altura?
Sim. Na altura ainda não havia equipas B’s, só no ano seguinte, e não se dava tanto valor à formação como se dá agora, não havia a aposta nos jovens que há hoje. Naquele tempo, um miúdo vindo da formação ir diretamente para uma Segunda Liga já era um patamar competitivo bastante interessante. Foi o passo certo, penso eu, na altura correu bem e depois voltei a integrar o FC Porto na equipa B.
Como dizias, depois do Trofense ainda voltaste ao FC Porto, mas jogaste sempre na B. Para os miúdos, especialmente formados num grande, é importante saber gerir as expetativas?
Sim. No meu caso fiz a formação toda no FC Porto e depois fui para uma realidade completamente diferente. Um estilo de jogo diferente, outras condições…. Muitas vezes isso afeta a evolução dos jogadores. Temos de estar preparados para tudo, é mesmo assim. Felizmente as coisas comigo correram bem e consegui dar seguimento à minha carreira.
“NA ROMÉNIA TIVE UMA EXPERIÊNCIA DIFERENTE, QUE ME FEZ CRESCER, E AGORA ESTOU DE VOLTA A PORTUGAL JÁ MAIS MADURO.”
Na altura de te estreares como sénior, para além da falta de aposta na formação, o FC Porto também já tinha um plantel muito forte. Acabou por ser uma conjugação de fatores?
Sim, sem dúvida. Era o facto de na altura não se apostar tanto na formação, o facto de o FC Porto ter uma excelente equipa, foi no ano em que ganharam a Liga Europa, em 2011. Essa conjugação dificultou a minha ascensão, por assim dizer. Gostava de me ter estreado e é algo que ficou por cumprir da minha parte. Mas o futebol continua, a vida continua e a minha carreira felizmente tem tido algum sucesso.
A verdade é que acabas por chegar à Primeira Liga em 2016, no Tondela. Após cinco épocas como profissional, como sentiste a estreia no principal escalão?
Era algo que eu já aspirava há alguns anos. Houve oportunidades para me estrear na Primeira Liga em anos anteriores, mas por uma razão ou por outra as coisas nunca aconteceram. Foi na altura que foi e agarrei a oportunidade. Foram três anos muito bons, gostei muito de estar em Tondela e as coisas correram todas muito bem. Era algo que, de facto, já esperava há algum tempo.
Fazes três épocas no Tondela, onde jogas com regularidade. Qual foi o fator que te levou a sair para a Roménia?
Na altura, precisava de sair um pouco da minha zona de conforto. Pensei que sair para outro país ia dar outro rumo à minha carreira e à minha vida. Foi com esse objetivo que emigrei. Fui para uma realidade completamente diferente daquilo a que estava habituado em Portugal. Longe da família, com outro tipo de condições – não para melhor -, mas foi uma experiência diferente, que me fez crescer e agora estou de volta a Portugal já mais maduro e a encarar as coisas de outra maneira.
“ESTIVE CERCA DE OITO MESES SEM VIR A PORTUGAL E CLARO QUE FOI COMPLICADO. NÃO PODER ESTAR PERTO DA MINHA FAMÍLIA FOI COMPLICADO PARA MIM.”
Como foi a adaptação ao país?
Foi complicado. No início foi bastante complicado. Sofri um pouco, por assim dizer, pelo facto de estar longe da família e as condições de trabalho deixavam um pouco a desejar, era outro tipo de competitividade. Não é que não houvesse, mas uma Primeira Liga portuguesa obviamente tem outra visibilidade, jogamos contra um FC Porto, Benfica ou Sporting, contra outro nível de jogadores e isso no início foi um pouco um choque para mim. Mas foi a decisão que tomei e a partir daí é bola para a frente e encarei tudo com naturalidade.
Viveste também a situação da Covid-19 na Roménia. Longe, numa realidade diferente… Como é que geriste tudo?
Foi complicado. Estive cerca de oito meses sem vir a Portugal e claro que foi complicado. Numa altura tão difícil para toda a gente no mundo, não poder estar perto da minha família foi complicado para mim.
Depois da experiência na Roménia, voltar a Portugal era a primeira opção?
Sim. O meu contrato era de dois anos, estava a terminar e eu já tinha decidido que queria voltar a Portugal. Claro que depois dependia das propostas que pudessem surgir. Felizmente apareceu o Estoril e foi com bons olhos que vi esse regresso a Portugal. Estou muito feliz com a minha decisão.
Hoje, voltavas a fazer exatamente as mesmas escolhas de carreira?
Talvez não, mas a vida é mesmo assim. Às vezes fazemos escolhas corretas e acertadas, outras erradas e temos de usar isso como uma forma de aprendizagem para, no futuro, não cometer os mesmos erros.
“A VIDA DE FUTEBOLISTA É CURTA E NUM ABRIR E FECHAR DE OLHOS ACABA A CARREIRA.”
Foste sempre dando a volta às várias situações na tua vida. Nalgum momento te sentiste “sobrecarregado” de alguma forma?
Não. Para nós, futebolistas, a vida é muito incerta e vamos tendo contacto com os jogadores mais experientes do plantel e vamos aprendendo e tendo conhecimento daquilo que se vai passando no futebol. Hoje, sou um desses jogadores mais experientes [risos]. Mas não, encarei tudo sempre com muita naturalidade. São coisas da vida, do futebol, como outro emprego qualquer.
Tendo em conta as tuas experiências, a nível de formação, de percurso, que conselho deixavas a jovens atletas?
Felizmente, como já falámos, agora há mais oportunidades. Há uma aposta maior no jovem português, felizmente, e têm qualidade. Os resultados a nível da seleção (sub-21) comprovam isso mesmo. Acima de tudo é não se iludirem, continuarem a trabalhar, a dar tudo todos os dias, porque a oportunidade é mais fácil e mais dia, menos dia, se mantiverem o seu compromisso com o trabalho, ela vai surgir.
A época vai a meio, estás de volta a Portugal, à Primeira Liga. A tua cabeça agora está assente apenas no presente ou os pensamentos do que poderá vir a seguir estão sempre presentes?
Não. Não vale a pena pensar à frente. O objetivo é o presente. Se queremos algo bom à frente, tem de ser construído agora, no presente, portanto o foco tem de estar no Estoril, na Liga Bwin e apenas isso.
A tua vida já deu algumas voltas, mas ainda só tens 29 anos. Que sonhos de menino ainda tens em ti?
Quando estava na formação do FC Porto o objetivo era chegar à equipa principal. Acredito que estive perto, não se cumpriu. Depois era jogar na Primeira Liga, felizmente consegui. Agora quero desfrutar do futebol, continuar a jogar e aproveitar todos os momentos. A vida de futebolista é curta e num abrir e fechar de olhos acaba a carreira e depois é que “ah era tão bom…”. Pois era. Temos de aproveitar todos os momentos enquanto cá estamos, dentro do campo, a jogar futebol.