"Procuro sempre, em tudo o que faço, ser um exemplo"


Avançado do Torreense superou uma lesão grave, contraída há dois anos, e regressou aos relvados.

Sais do Vitória, já com 35 ou 36 anos, mas continuas na Primeira Liga, desta vez no Feirense. Nessa altura já sentias algum estigma com a tua idade?
Não. Não, porque sempre impus desafios a mim mesmo, como ainda hoje faço. Claro que chegas a uma idade em que começam a olhar para o BI. Isso dá-me mais motivação. Essa motivação, especialmente no Feirense, era provar que a idade é um número, que se te tratares bem, fizeres uma boa alimentação, tiveres um bom descanso, podes alargar a tua carreira. O objetivo era sempre esse: demostrar que ainda tinha capacidades para tal e, estando num clube com condições e estrutura, isso foi possível.

Em 2019 desces ao Cova da Piedade, regressas a Almada, e experimentas-te na II Liga. A dita descida à Liga 2 foi algo que te incomodou?
Não, porque na altura tive duas propostas de clubes da Primeira Liga, mas da maneira como me abordaram não senti confiança. Senti que iria mais para um projeto de ajudar em caso de necessidade, não tanto de ser alguém que podia fazer a diferença. Para estar na Primeira Liga por estar, prefiro estar na Segunda e lutar por algo diferente, nem que seja não descer de divisão. O objetivo e o desafio em si é o que me move. Acabei por ir para o Cova, fui o melhor marcador da equipa, as coisas correram bem e depois quando veio a pandemia é que, com os problemas financeiros, começou a ficar mais complicado e a equipa foi-se desmoronando.

É no Cova que acabas por te lesionar com gravidade. Sentiste no momento a gravidade da situação?
No momento não. Senti quando caio ao chão, tento-me mexer e não consigo. Não senti dor na altura. Lembro-me de olhar para a caneleira e ver como ela estava partida, uma caneleira de fibra de carbono, e perceber que era algo muito grave. Naquele momento o meu pensamento foi “calma, tens um longo percurso, tu és forte, agora tens de te mentalizar que vais estar fora muito tempo”. Acho que isso me ajudou a não sentir dor. A primeira vez que sinto é já no hospital. Comecei a preparar a minha mente, comecei a mentalizar-me que este ia ser provavelmente o desafio mais complicado da minha carreira, por causa da minha idade e tudo. Depois as coisas foram encaixando normalmente. Não desanimei, não me deixei ir abaixo.

“AQUILO QUE MEXEU MAIS COMIGO, E AGRADEÇO ATÉ HOJE, FOI O FACTO DE A MAIOR PARTE DOS JORNAIS DIZEREM QUE O EDINHO TINHA TERMINADO A CARREIRA. ISSO DESPERTOU EM MIM UMA NECESSIDADE DE MOSTRAR QUE EU PODERIA VOLTAR A SER UM EXEMPLO DE SUPERAÇÃO.”

Com a gravidade da lesão, com a idade e com uma recuperação tão longa, um ponto final na carreira nunca foi opção?
Vou-te ser muito honesto. Quando vi as notícias – e agradeço porque recebi mensagens de toda a gente – aquilo que mexeu mais comigo e agradeço até hoje foi o facto de a maior parte dos jornais dizerem que o Edinho tinha terminado a carreira. Isso despertou em mim uma necessidade de mostrar que eu poderia voltar a ser um exemplo de superação. Eu lembro-me de ter ligado à minha mulher a dizer “Amor, tenho o maior desafio da minha vida. Eu vou mostrar que posso ser um exemplo, que vou recuperar antes do tempo [previsto] e que sou feito de outra fibra”. A primeira coisa que fiz depois foi ligar ao Gaspar, que era o nosso fisioterapeuta da Seleção, a perguntar se ele tinha disponibilidade para me receber e para eu recuperar. Tenho uma gratidão imensa a ele e ao Diogo Cardoso, de Esposende, porque foram duas pessoas importantíssimas que tiveram comigo no momento mais difícil, mas que me deram força e todas as condições para eu voltar mais forte que nunca.

De onde vem essa vontade de lutar, recuperar, jogar?
Acho que vem daquilo que sou como pessoa. Sinto que tenho um propósito. Eu sinto que posso ser um motivo de inspiração para outras pessoas e é isso que eu procuro ser. Procuro ajudar, inspirar, porque acredito que do outro lado existe sempre alguém em busca de uma palavra de motivação, de uma palavra de “continua a trabalhar, o teu sonho é possível”, Persiste. Não é um mundo de rosas, mas vale a pena”. Costumo dizer muitas vezes que nós plantamos uma rosa e se deixarmos de cuidar dela, começa a nascer erva. Ou seja, nasce sempre qualquer coisa. Temos de cuidar, temos de plantar, sabendo que nem tudo vai correr bem, sabendo que vai haver desafios e barreiras, mas a nossa persistência, o nosso porquê, o nosso desejo é mais forte que tudo. Nós não devemos de desistir daquilo em que somos bons, daquilo que achamos que é nosso por direito. Então, procuro sempre, em tudo o que faço, ser um exemplo, inspirar, motivar, porque acredito que isso foi o que me fez chegar onde eu cheguei. Pessoas como o George Weah, o Cristiano Ronaldo são um exemplo para quem quer chegar longe. Não é só olhar para o Cristiano e dizer que ele tem tudo o que quer. Ok, mas e os sacrifícios que ele fez, a vida dele que foi privada? Eu costumo dizer que sou grato por tudo. Grato pelos desafios, pelas barreiras, pelas conquistas, por ter saúde, por ter a família que tenho. Vou sempre batalhar pelo melhor. Sempre.

Psicologicamente nunca te foste abaixo?
Fui, muito. Muitas vezes, só que quando vou abaixo pergunto-me quem depende de mim. Olho para onde comecei, no Monte da Caparica, os sonhos que tinha, tudo o que conquistei e, principalmente, para o meu pilar, que é a minha mulher e os meus filhos. Quando me deixo ir abaixo e quando entro em campo vou sempre com esta mentalidade de “se eu não estiver bem e se eu não der tudo de mim, a minha família vai sofrer”. Então, eu procuro dentro da minha cabeça arranjar um motivo que não me faça quebrar, que me faça não desistir, que me motive. O segredo é esse. Se todos nós pusermos em causa algumas coisas, vamos sempre retirar o máximo das nossas potencialidades.

“PROCURO DENTRO DA MINHA CABEÇA, ARRANJAR UM MOTIVO QUE NÃO ME FAÇA QUEBRAR, QUE ME FAÇA NÃO DESISTIR, QUE ME MOTIVE.”

O apoio de quem te rodeia é um aspeto fundamental para conseguir dar a volta e voltar aos relvados?
Sem dúvida. Principalmente os amigos sérios, digamos assim. No mundo do futebol encontras muita gente, especialmente quando atinges um certo patamar, encontras muita, muita gente, mas às vezes é difícil entender quem são realmente os teus amigos. Graças a Deus, sempre tive amigos que sempre foram amigos, ou seja, não são aqueles que estão lá só para os copos, são os que te dizem que estiveste mal, que não foste correto. Aqueles que te dizem faz assim, faz assado, que te ligam quando estás bem, mas também quando estás mal e isso é importante. É importante porque faz com que tu cresças, evoluas e principalmente que nunca saias do caminho certo.

Com 39 anos, ainda a competir profissionalmente, tens muitos admiradores e és uma inspiração. Para os que te veem, que conselhos dás para conseguir ultrapassar estes reveses (lesões) do futebol?
O conselho que eu dou é procurarem evoluir sempre, seja a nível físico ou a nível mental. Procurem estar em constante evolução. O Edinho só consegue atingir certos patamares porque se educa. Procuro inspirar-me nas pessoas que têm o sucesso que eu quero ter. Leio livros de mentalidade, de como superar desafios. Procuro desenvolver conhecimentos da mente humana, de nutricionismo. E ter uma mentalidade forte. Acima de tudo a tua mentalidade. Saberes que tens um dom, que Deus te deu um dom, e a única coisa que nos define é sabermos reconhecer esse dom e trabalharmos exaustivamente para desenvolvê-lo todos os dias. Acho que é o melhor conselho que posso dar. Acreditar sempre.

Sei que tens alguns projetos paralelos ao futebol. Consideras-te uma pessoa muito virada para o empreendedorismo?
Sou uma pessoa que procura estar sempre muita atenta a tudo o que possa melhorar a minha vida. Neste momento desenvolvo um negócio online, network marketing, tenho uma equipa, dou mentorias e é um mundo fantástico. Acredito que esta área é aquela que vou continuar a desenvolver no futuro até porque é algo que posso conciliar com o futebol. Sou muito virado para o empreendedorismo porque acredito que na sociedade em que vivemos hoje, uma só fonte de rendimento não te garante uma vida tranquila.

“O MEU MAIOR OBJETIVO, NESTE MOMENTO, É REGRESSAR À SEGUNDA LIGA.”

Por agora, continuas nos relvados, desta vez na Liga 3. Como está a ser a experiência nesta nova competição?
Está a ser um sucesso. Vemos equipas muito organizadas, bem estruturadas, muita competitividade, muitos jovens com talento. Eu, sem sombra de dúvida, ao início estava com medo, como é que iria ser e hoje vejo que é uma competição bem organizada e creio que o futuro está assegurado.

Nesta nova competição reencontraste antigos clubes, entre eles o Vitória e o Cova da Piedade. Estes reencontros deixam-te nostálgico?
Muito. Confesso que o jogo com o Vitória foi o que me deixou mais nostálgico e apesar de eles terem ganho aqui, e eu ter ficado extremamente chateado, eles sabem que eu não gosto de perder, foi um jogo que me disse muito. Não tive oportunidade de jogar lá [no Bonfim], era um jogo que queria muito ter jogado, especialmente por causa dos adeptos que me adoram e por quem tenho um grande carinho. Vou estar sempre a torcer porque o Vitória, o Torreense e mesmo o Alverca merecem outros patamares, quer pela estrutura, por aquilo que representam e pela história que têm.

Por falar noutros patamares, com o Torreense bem lançado, será que ainda vamos ver o Edinho de volta à Segunda?
Sem sombra de dúvidas. O meu maior objetivo, neste momento, é regressar à Segunda Liga. Devido à lesão que tive este ano, tive pequenos percalços que não me permitiram mostrar realmente e estar nas condições físicas ideais. Agora estou, portanto, acredito que podemos chegar à Segunda Liga, eu quero chegar à Segunda Liga, para depois deixar isto para os mais jovens. Quero acabar sim na Segunda Liga e se Deus quiser iremos conseguir este ano. Estamos confiantes, estamos unidos. E como digo, eu nunca, mas nunca deixo de atingir os meus objetivos.