"Quando me lesionei, em 2014, fiz o clique e comecei a investir a sério"


Internacional português Sílvio inaugurou este ano o ginásio CAPLX.

 

Sílvio, com uma carreira assinalável, com oito títulos nacionais e dois europeus no currículo, ter uma atividade paralela ao futebol ou ter um plano B esteve sempre presente na tua mente ou essa ideia só surgiu com o aproximar do final da carreira?
Esta ideia surgiu há cerca de três anos, quando estava sem clube e treinava à parte com um colega meu, que hoje em dia é o meu parceiro de negócio. Na altura treinávamos num ginásio de Lisboa e não me sentia à vontade nesse espaço em questão. Então pensámos por que não abrir um ginásio em que um atleta profissional tivesse a privacidade para fazer o seu trabalho sem ninguém a olhar atentamente. Foi assim que surgiu a ideia do CAPLX (Centro de Alta Performance – Lisboa).

Quando terminares a carreira este negócio será a vertente que pretendes seguir ou vai continuar a ser uma atividade paralela à que vier a seguir?
Para ser sincero nunca tinha pensado em investir neste ramo. Gosto muito de investir no setor imobiliário, que foi onde comecei já há alguns anos. Agora, isto é um hobby, uma paixão, que sempre esteve presente. Decidimos abrir este ano e está a correr bem, que é o mais importante.

Sentes que com este negócio, do ginásio, a ansiedade e preocupação do final da carreira não é tanta?
É muito importante o profissional de futebol começar a pensar desde cedo no término da carreira. Como futebolista ganha-se muito dinheiro quando se atinge patamares altos, nem todos ganham aquilo que as pessoas pensam. Mas acho que qualquer um deles, quer ganhe menos ou mais, deve pensar no final da carreira. É uma atividade em que se ganha dinheiro, mas é curta. É importante preparar tanto o nosso futuro como o das nossas famílias, porque de um momento para o outro a carreira acaba e se não tivermos esta preparação desde cedo, os rendimentos também acabam, mas as despesas continuam. Se não estivermos preparados, não temos dinheiro para suportar essas despesas.

Estando ainda no ativo, até há bem pouco tempo a competir até na Primeira Liga, foi muito difícil gerir e planear a abertura do ginásio?
Não é fácil. Tenho a sorte de ter um sócio, o Hugo Costa, que me ajuda, que é incansável e dou graças a Deus por o ter encontrado e por ser meu parceiro neste negócio. Não é fácil porque o futebol não é só aquelas horas de manhã que as pessoas pensam. “Ah, ser futebolista é fácil, treinam aquelas horas de manhã, depois jogam ao fim de semana, têm muito tempo”. Não é bem assim. Há o treino de manhã, há a alimentação, o descanso, a preparação para o jogo, que leva muito tempo da tua vida. Não é fácil ser futebolista e ter uma carreira paralela a isso, mas as coisas fazem-se. Quando se quer muito uma coisa, tudo é possível.

“MUITOS PENSAM QUE VÃO CHEGAR LÁ ACIMA E GANHAR OS MILHÕES QUE OS JOGADORES DE TOPO GANHAM, MAS NÃO É BEM ASSIM.”

Mesmo com o sucesso que foste tendo ao longo dos anos, nunca tomaste nada no futebol por garantido?
Não, nunca tomei nada por garantido até porque sempre fui um jogador com muitas lesões. Acho que toda a gente sabe isso, não é mentira nenhuma. A minha primeira lesão foi no primeiro ano no Atlético de Madrid, lesionei o joelho e tive muito tempo para recuperar. Depois no Benfica parti a perna, fraturei a tíbia e o perónio em 2014 e foi aí que fiz o clique e comecei a investir a sério. Depois dessa lesão não sabia se voltaria a competir ou não.

Como podemos fazer os mais jovens ver que no futebol tudo pode mudar do dia para a noite e que é preciso estar preparado para uma vida fora das quatro linhas?
Há muitos exemplos desses, de jogadores que têm muito talento e tudo para serem grandes jogadores e de um momento para o outro têm uma lesão e tudo muda. Acho que os mais jovens têm de olhar seriamente para esses exemplos. No futebol é tudo muito bonito, todos os miúdos pensam que vão ser futebolistas, os que são, muitos pensam que vão chegar lá acima e ganhar os milhões que os jogadores de topo ganham, mas não é bem assim. Há uma percentagem muito pequena de jogadores que chegam lá acima e ganham os tais milhões. Há que ter os pés bem assentes na terra, trabalhar muito para aquilo que se quer, mas sempre conscientes das dificuldades, dos percalços, dos azares que podem acontecer, e estar preparados.

Que conselho é que darias, ou dás no teu dia a dia, aos jogadores mais jovens?
Que lutem pelos seus objetivos com tudo o que têm, mas com os pés bem assentes na terra porque é uma profissão muito difícil. Tem de se lutar muito, trabalhar muito e ter muita sorte. Acho que hoje o que mais temos de ter é sorte – não basta o talento e trabalhar. Temos de ter muita sorte com as lesões, estar no sítio certo à hora certa.

Numa nota mais pessoal, que perspetivas tens para o teu futuro a curto prazo?
As minhas perspetivas a curto prazo… Neste momento estou no Vilafranquense, assinei por um ano, estou lá de corpo e alma, para ajudar o clube e a equipa a conquistar os seus objetivos. Já não vou para novo, já tenho 35 anos, quase a fazer 36, já sinto que não sou o mesmo Sílvio de há umas épocas, portanto, estou a sentir que o término da carreira está cada vez mais próximo. Mas sinto-me confortável com isso, porque lá está, tive este processo todo, este trabalho todo desde cedo e tenho muitas coisas para fazer fora do futebol. Adoro o futebol, amo o futebol, mas tenho muitas coisas… Quero ter tempo para a minha família. Quem sabe possa ficar ligado ao futebol noutras funções, mas não me preocupo com isso agora. Quando acabar quero ter, acima de tudo, tempo. O que penso mais é em ter tempo de qualidade com a família.