Empreendedor inspirado em Pilates


Bruno González fundou o Studio 86 Pilates um ano depois de terminar a carreira de jogador.

Terminou a carreira de futebolista em 2020 e um ano depois abriu o próprio negócio, fundando o Studio 86 Pilates, em Lagos.

Bruno González admite que a disciplina como jogador o ajudou a ter um espírito empreendedor e confessa que não sente saudades do futebol.

Quando é que surgiu a ideia de abrires o Studio 86 Pilates?
Abrir o meu estúdio surgiu depois da pandemia. Já trabalhava noutro estúdio. Entretanto com a pandemia as coisas complicaram-se um bocadinho, como para toda a gente, e achei que era a oportunidade de abrir o meu negócio e começar as coisas por mim, uma vez que já trabalhava na área e foi a altura certa para abrir. Desde aí tem corrido bastante bem. Na altura em que trabalhava no outro estúdio, conciliava com o futebol e a faculdade, porque terminei a licenciatura no último ano em que joguei.

No que é que consiste o método Pilates?
O método começou por se chamar contrologia porque Pilates não deu o nome dele ao método, só passou a ter o seu nome quando faleceu. Foi iniciado por ele na altura da II Guerra Mundial, porque a mãe dele era enfermeira e ele foi criando estas máquinas com molas dos colchões das camas, para os soldados recuperarem e irem fazendo exercício. A partir daí foi construindo um método que até hoje é usado, com os exercícios que ele criou. Alguns estúdios vão adaptando, mas muitos ainda se regem pelos exercícios criados por ele.

És um exemplo, não só por teres criado o próprio negócio, mas também por teres concluído a licenciatura em educação física e desporto. Como é que se consegue conciliar tudo isto?
Para conciliar isto tudo não se pode ter filhos e na altura ainda não havia. Mas não é fácil. Temos de fazer um esforço extra, porque o futebol é o que custa menos, porque é o que mais gostamos, mas sofremos um pouco porque temos de estudar, fazer trabalhos, deitar tarde, o rendimento se calhar baixa um bocadinho, mas tudo se faz. Quando sabemos que precisamos disso e queremos preparar o final de carreira, temos de pensar nisso e fazer esse esforço.

Nunca te passou pela cabeça continuar ligado ao futebol quando terminasses a carreira de jogador?
Inicialmente pensei, mas sendo muito sincero, para além de jogar, não há nenhum cargo no futebol que gostasse de exercer. Quando terminei surgiu o convite para continuar, mas não quis porque achei que ia ser muito mais difícil para mim deixar de jogar e continuar lá todos os dias. Deixei de jogar porque o campeonato parou na pandemia e eu decidi já não regressar, mas fisicamente estava muito bem para continuar e achei que ia ser difícil para mim deixar de jogar e ir lá todos os dias como diretor ou o que fosse e preferi desligar completamente. Depois de desligar, sendo sincero, não tenho vontade de me voltar a envolver com o futebol, porque acho que hoje é um mundo muito competitivo, demasiado agressivo e já não me revejo muito nisso.

Enquanto jogador ficou algum sonho por realizar?
Ficam sempre sonhos por realizar, mas sendo realista acho que fiz tudo o que conseguia da melhor forma que podia. Claro que gostava de ter jogado na Primeira Liga, mas também temos de ter a noção das nossas limitações e acho que ter chegado à Segunda Liga e feito a carreira que fiz já foi muito bom.

“MUITA GENTE NÃO PODE SER LÍDER SE NÃO FOR LIDERADO E ISSO É ALGO QUE TRAZEMOS DO FUTEBOL.”

O facto de não teres jogado na Primeira Liga fez com que acelerasses o processo de transição para outra atividade?
Essencialmente a necessidade de estudar foi para me garantir uma segurança para quando terminasse. Porque quando jogas futebol a vida toda, quando terminas não sabes fazer mais nada, porque nunca fizeste. Aprendes e toda a gente tem de se fazer à vida um dia, mas queria preparar-me para fazer algo relacionado com o desporto e a atividade física. Ainda treinei miúdos, mas acabei por me desligar porque abrir o próprio negócio consome muito tempo, e com duas filhas, optei por aquilo que me dava maior rendimento.

Na tua carreira de jogador tiveste uma curta passagem pelo futebol cipriota. Essa experiência ajudou-te a lidar melhor com as adversidades?
Foi uma passagem que não correu tão bem como esperava. Tinha 19 anos, fui para Ayia Napa, uma Vilamoura de Chipre, com muita gente, vida noturna e muita atividade, mas as coisas não correram como esperava, porque lá estão 50 graus durante o dia e deram-nos uma casa sem ar condicionado. Era impossível dormir. Foi uma adaptação complicada porque eles não gostaram das condições que exigi e só estive lá seis meses. Fiquei com a noção de que um empresário não me resolve a vida, porque quando as coisas começaram a apertar fiquei lá. Tens de ser tu por ti e dificilmente alguém te vai ajudar mais do que tu a ti próprio.

Além de Chipre, jogaste na Segunda Liga e Campeonato de Portugal. Que diferentes realidades encontraste?
Quanto mais baixa é a divisão mais puro é o futebol, porque quem joga na distrital faz um grande esforço, uma vez que trabalha o dia todo, e no futebol profissional prevalece a questão financeira, as pessoas são mais desleais, há muito dinheiro envolvido, e na distrital, se fores bom jogador, jogas.

A tua veia empreendedora vem das características que um jogador de futebol deve ter, como a rapidez na tomada de decisões?
Sim, principalmente no futebol profissional dá-nos disciplina. Temos horários para cumprir, estágios, tudo isso são regras que temos de cumprir e que nos tornam mais organizados. Ter um treinador que nos dá ordens é como ter um patrão e isso é uma grande virtude. Muita gente não pode ser líder se não for liderado e isso é algo que trazemos do futebol. Tento sempre trabalhar de forma igual com os meus funcionários, mas sem impor essa liderança. Aí aprendemos o bom e o mau das coisas.

Tens conhecimento de ex-colegas teus do futebol que também tenham investido no seu próprio negócio?
Sim, o Diogo Melo, que é barbeiro e treinador no Carvoeiro United, e o Hugo Luz, que jogou no Farense, e hoje é tomador de seguros da Tranquilidade e tem um sucesso tremendo.

“TERMINEI O 12.º ANO ATRAVÉS DO SINDICATO E FOI A PARTIR DAÍ QUE VI QUE PODIA CONTINUAR A ESTUDAR, JOGANDO.”

Sentes que há cada vez mais a preocupação por parte do jogador no ativo de ter de investir no seu futuro?
Acho que é 50/50. Muitos já se preparam, se bem que numa Segunda Liga não se acaba a carreira preparado financeiramente para estar estável e investir em negócios e imobiliário. Jogando na Segunda Liga, é difícil acabar a carreira com a vida organizada. O melhor investimento que podes fazer, não ganhando ordenados exorbitantes, é investir em ti, porque garantes que quando terminares vais à luta e continuas. Acho que já há essa preocupação, pelo trabalho que o Sindicato tem vindo a fazer de promover a educação. Terminei o 12.º ano através do Sindicato e foi a partir daí que vi que podia continuar a estudar, jogando. Há muitos jogadores que vivem agarrados à ideia de continuarem ligados ao futebol quando acabarem, mas infelizmente não dá para todos.

Como é que resumes a tua carreira de jogador? Arrependes-te de alguma decisão?
Não me arrependo de nada. O que fiz foi o que me levou onde levou. Foi uma carreira boa, deu para viver como profissional, vim ao amador e tive de correr atrás para conseguir as coisas. Isso dá-me bastante orgulho porque quando cheguei a profissional nunca tive empresário. Por onde passei deixei uma boa imagem e isso é o que me deixa mais orgulhoso.

Como é que conseguiste colmatar a ausência do futebol na tua vida?
Ao início não foi fácil porque são muitos anos da mesma rotina, por outro lado tinha uma filha pequena e vê-la crescer foi um tempo que recuperei, por estar mais presente em casa. É por essa razão que não volto ao futebol, porque iria perder o crescimento das minhas filhas.

Como é que defines o teu espaço?
Como um espaço que promove saúde, onde as pessoas vêm para saírem daqui bem e onde tenho de tratar todos da mesma forma. É um espaço que tem tido algum sucesso e isso deixa-me muito feliz. Ver o crescimento do Studio é sinal de que as coisas estão a ser bem feitas. Abrimos na altura da pandemia, com meia dúzia de clientes que já tinham feito marcações online, mas com um pouco de medo a ver no que dava. Passado uns meses as coisas foram crescendo.

Que sonhos é que ainda tens para a tua vida?
Posso dizer que me sinto bastante realizado. A nível familiar, sou casado, tenho duas filhas, viajamos muito e vivemos bastante em família. O negócio está a correr bem, gostava de o expandir, mas não depende só de mim, porque preciso de pessoal qualificado para trabalhar, mas temos uma situação financeira bastante estável e conseguimos aproveitar muito tempo em família, o que me deixa muito feliz.