Eu sou o futebol


Há no futebol português quem pretenda fazer renascer ideias absolutistas. Eu quero, eu posso, eu mando! Eu sou o futebol! Homens que nunca se enganam, que se julgam superiores aos seus semelhantes e se arrogam o direito de os humilhar ou decidir o seu futuro. Porque sim!

Esta gente, medíocre, é incapaz de respeitar a diferença, a liberdade de escolha, o sucesso do adversário, os valores do desporto. Começou mais uma temporada e os velhos hábitos estão de volta. Velhos e maus. Sem respeito por compromissos assumidos, alguns clubes não se coíbem de tratar os futebolistas – que pomposamente tratam por activos quando paira no ar a hipótese de os rentabilizar – como objectos que passaram o prazo de validade.

As práticas abusivas multiplicam-se com o objectivo de obrigar o elo mais fraco a ceder. Remeter um jogador para a equipa B quando já não é esse o seu estatuto, colocá-lo a trabalhar à margem do ‘grupo principal’ e alterar horas e locais de treino, instaurar processos disciplinares com ameaça de multa ou despedimento são imposições que visam forçar o trabalhador a aceitar condições que não o favorecem.

Este ano, aliás, fomos brindados com (mais) uma surpresa: a utilização, por parte da Académica, do ‘despedimento colectivo’, para se libertar de encargos que dizia não poder suportar com a descida à 2.ª Liga. Ao mesmo tempo continua a contratar jogadores para as posições libertadas pelos proscritos. Vale tudo!

Estas práticas, porém, têm sofrido um importante revés na justiça. Recentemente, o Tribunal Arbitral do Desporto condenou os polacos do Slask Wroclaw a ressarcirem o avançado albanês Plaku. Este recusara-se a baixar o salário, tendo sido objecto de retaliações, que incluíram ter de ir treinar nas férias e no próprio Dia de Natal ou não receber o salário por inteiro. Dando um exemplo que gostávamos de ver seguido, Plaku não se atemorizou e foi à luta, conquistando importante vitória para toda a classe.

Ainda assim, e apesar do arranque sombrio, esperamos que os intervenientes se comportem à altura. Respeitando, em primeiro lugar, o protagonista, o jogador. Fomos campeões da Europa dentro do campo, era bom sermos campeões fora dele.

Artigo de opinião publicado em: jornal Record (16 de Agosto de 2016)

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