A voz de Uchebo


Michael Uchebo, jogador do Boavista, internacional nigeriano, está sem receber desde Abril porque não aceitou rescindir o seu contrato de trabalho. Sem dinheiro e sem amigos, vive dias dramáticos.

Ontem, atendendo à dimensão nacional e internacional que o seu caso ganhou, decidiu, na primeira pessoa, esclarecer cabalmente esta situação! Fê-lo na sede do Sindicato dos Jogadores, entidade que lhe está a prestar apoio pessoal, jurídico e financeiro. Sozinho no Porto, numa casa alugada pelo clube cuja renda está em atraso, o avançado nigeriano deu a conhecer o seu drama.

O Michael Uchebo é apenas um dos muitos casos de jogadores que são ‘confinados ao isolamento’, sem solução à vista. Ainda recentemente, a FIFPro denunciou práticas abusivas e ilegais levadas a cabo pelo APOEL, do Chipre, que pressionou três jogadores a rescindir contrato, colocando-os a treinar à parte e em condições desumanas.

O futebol português não pode continuar a resolver erros de gestão, promovendo situações destas, sem o mínimo de respeito por direitos fundamentais. Uchebo é corajoso, é bravo, um ser humano singular. Não aceita o que lhe é imposto unilateralmente. Exerce os seus direitos, denuncia abusos, faz ouvir a sua voz. Esta atitude individual é mais do que isso, é um gesto maior na defesa de todos aqueles que se encontram em situação idêntica e não podem ou não são capazes de o fazer.

Ser forte com os fracos e fraco com os fortes é uma atitude cada vez mais recorrente no futebol português. É tempo de mudar de paradigma. Uchebo convida-nos a fazê-lo. Mesmo à beira do abismo, e consciente de que alguns lhe querem dar um empurrão, agarra-se à sua dignidade e à profissão que ama.

Os agentes desportivos, adeptos, comunidade local, em especial o Boavista, não podem ser indiferentes a este apelo. Ainda vamos a tempo. O Boavista vai sempre a tempo de fazer parte da solução. Um clube que, apesar das dificuldades que ultrapassou e ultrapassa, tem merecido dos agentes desportivos disponibilidade para a resolução dos seus problemas, não pode comportar-se desta maneira. Uchebo ama o futebol e ‘vestiu’ a camisola. Merece poder exercer a sua profissão, fazer aquilo que mais gosta: jogar futebol.

Artigo de opinião publicado em: jornal Record (22 de Novembro de 2016)

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