A crise dentro da crise
Esta semana, ainda a propósito da decisão referente às descidas ao Campeonato de Portugal das SAD’s de Vitória FC e CD Aves, retomo a reflexão sobre o licenciamento dos clubes e a eficácia da autorregulação no que respeita à criação de um sistema onde a compliance não é apenas um chavão.
Muito evoluiu o sistema de licenciamento e controlo financeiro ao longo dos anos, mesmo com a Liga sempre condicionada entre o papel essencial de regulador e a defesa dos interesses corporativos.
Ainda assim, não temos um sistema preventivo, no sentido de proteger e premiar os clubes cumpridores e sancionar ou limitar a ação dos incumpridores.
A figura do PER ou do SIREVE, por exemplo, a que muitas SAD’s têm recorrido, não tem cumprido o pressuposto fundamental da sua existência: garantir a sustentabilidade financeira e reajustamento da atividade empresarial à sua realidade económica. Pelo contrário, tem servido para deixar clubes concorrentes em posição desigual, protelando o pagamento de dívidas sem inibir, no plano desportivo, a continuação dos mesmos atos de gestão, tantas vezes ruinosa, do clube devedor e, portanto, a acumulação de passivo, como uma bola de neve, até ao desastre.
Outro tema atual em matéria de regulação e essencial para a integridade competitiva é o do escrutínio dos investidores por detrás das SAD’s no futebol português. Já percebemos que a mera identificação do beneficiário último não é suficiente e que existem investidores que contornaram a proibição do TPO, adquirindo a participação maioritária em SAD’s.
Precisamos de refletir sobre como atrair investimento, mas escrutinar a idoneidade de quem investe e sancionar quem presta falsas declarações.
Termino com a renovação dos parabéns ao FC Porto, e em particular aos seus jogadores, pela conquista da Taça de Portugal, fazendo assim a dobradinha. Um feito que mostra enorme resiliência numa época especialmente difícil.
Artigo de opinião publicado em: jornal Record (4 de agosto de 2020)