Mais fiscalização e menos insólitos
Uma das marcas indeléveis da última legislatura foi a massiva produção normativa em torno de vários temas estruturantes no desporto. Temos um novo quadro legal para a atividade das sociedades desportivas, meritório em vários aspetos, mas após a sua entrada em vigor falta compreender a capacidade de implementação, desde logo ao nível da fiscalização das situações de incumprimento.
Neste caso, concordo com a corrente de pensamento sobre a qual atribuir a competência fiscalizadora ao IPDJ poderá não ter sido a solução mais eficiente, pelo menos na configuração atual e pressupondo que o reforço dos quadros qualificados e recursos disponíveis para fazer cumprir estas atribuições será decidido com a próxima legislatura.
A fiscalização adequada dos requisitos de idoneidade dos investidores é absolutamente essencial e tem de ser melhorada, em articulação com os organizadores das competições que não podem permitir, seja em sede de licenciamento, seja nos controlos realizados ao longo da época, que continuemos a ter uma situação de claro colapso financeiro, desresponsabilização e sentimento de impunidade, seja de investidores seja de responsáveis pela administração.
Poderia dar muitos exemplos de situações que se perpetuam no tempo sem que haja uma efetiva capacidade de romper com a espiral de incumprimento ou exigir a prestação de contas, mas nos últimos dias foi noticiado um insólito que não passou ao lado de muitos dos que, como eu, estão preocupados com a situação da Länk Vilaverdense SAD. Uma sociedade desportiva desorganizada nas dívidas a jogadores e jogadoras ao seu serviço, com atualizações diárias no número de atletas que procuram, junto do Sindicato, apoio jurídico para recuperar os seus créditos.
Entre o descalabro da gestão financeira, os processos em curso nas instâncias desportivas e a incógnita sobre o futuro, junta-se o recrutamento de Courtney Reum, que aos 45 anos e sem qualquer histórico no futebol profissional, leva pelo menos a questionar os motivos para a sua contratação.
Nada me move contra a pessoa, sejam quais forem os objetivos que prossegue, mas não posso deixar de assinalar com preocupação o caminho que leva um projeto que integra, porque foi licenciado para o efeito, o futebol profissional em Portugal.
No debate político que aí vem seria excelente perceber que visão têm os partidos sobre o papel do Estado, articulado com as organizações desportivas, para garantir a defesa da integridade das competições, com enfoque no escrutínio dos investidores, da proveniência dos seus capitais e das sanções que continuam a tardar em casos gritantes de fraude ou incumprimento.
Infelizmente, sei que voltarei ao tema das dificuldades em aplicar os novos regimes legais e do trabalho que ainda tem de ser feito para nos equipararmos aos bons exemplos.
Artigo de opinião publicado em: jornal Record (4 de fevereiro de 2024)