Desencontros entre política e desporto
Estamos próximos do ato eleitoral e nesta altura destaca-se a pouca importância que os partidos têm dado nos seus programas ao desporto, não apenas enquanto setor de atividade económica, mas sobretudo como fator de desenvolvimento social. Breves notas programáticas e princípios gerais, como por exemplo a necessidade de revisão da Lei de Bases do Desporto, devem despertar em todos os agentes do desporto a importância de fazer ouvir as preocupações no terreno.
A última legislatura foi marcada por intensa produção legislativa, que será posta à prova durante os próximos anos. Sendo certo que para os praticantes desportivos profissionais algumas medidas tomadas representam avanços positivos, a mexida em regimes como o de acidentes de trabalho, sem olhar às falhas graves do sistema de proteção social, são o ponto de partida para algumas notas que deixo na ótica dos jogadores de futebol.
É urgente uma revisão integrada do sistema de Segurança Social dos jogadores, amputado gravemente no que respeita às doenças não profissionais e incapaz de responder aos desafios do final de carreira. Nem com a proposta do Fundo de Pensões que o Sindicato apresentou, equilibrada e complementar às contribuições para a Segurança Social, foi possível rever as condições de resgate de pensões pelos praticantes desportivos, tão importantes para responder aos desafios financeiros da transição.
Ainda sobre reforma, muitos ex-jogadores estão a ser confrontados com as falhas dos seus clubes em relação a contribuições que deviam ter sido pagas nas décadas de 70, 80 ou 90, sendo surpreendidos com falhas na carreira contributiva no momento de requerer a pensão. O número de casos é tão significativo que justifica uma análise séria das soluções que reponham alguma justiça social a estas pessoas que deram os melhores anos da sua vida ativa ao futebol.
Os incentivos que já existem às carreiras duais são importantes, mas é possível fazer mais e abranger uma faixa de atletas que continua a ter muita dificuldade em penetrar no mercado de trabalho fora do setor público, criando incentivos ao seu recrutamento.
Os desafios da igualdade de género são tremendos e, além das novas regras de composição de órgãos estatutários, justificam-se apoios efetivos à profissionalização de jogadoras pelos respetivos clubes, impulso que seria relevante, a somar ao esforço financeiro da FPF, para alcançarmos o primeiro acordo coletivo de trabalho no futebol feminino.
Reservo, ainda, uma nota para a justiça desportiva e a tão falada reforma do Tribunal Arbitral do Desporto. Respeitando muito a qualidade do colégio arbitral, destaco o problema das custas, tremendamente elevadas, e a inadmissibilidade de apoio judiciário na arbitragem voluntária como pontos a rever, para garantir um efetivo acesso à justiça.
Artigo de opinião publicado em: jornal Record (25 de fevereiro de 2024)