Os alicerces da fábrica do talento
As palavras recentes do selecionador Roberto Martinez, a somar ao que Jürgen Klopp já tinha dito sobre o jogador português, são motivo de grande orgulho. Se dúvidas houvesse, o garante da sustentabilidade e crescimento do futebol português é o jogador, bem formado, resiliente, talentoso e naturalmente capaz de se adaptar a diferentes culturas e contextos competitivos.
Já tive oportunidade de elogiar o trabalho na formação e o grande investimento que tem sido feito por alguns clubes em infraestruturas e recursos humanos. Diga-se que o processo de certificação da FPF foi, igualmente, fundamental para o upgrade.
Não é por acaso que nos últimos anos se evidenciaram nos principais clubes nacionais jovens com uma maturidade muito acima da média. Essa é a nossa imagem de marca, o verdadeiro segredo que dá muito trabalho e requer bastante investimento. Em relação a este último aspeto importa referir que nem todos os jovens futebolistas têm a mesma sorte de poder contar com um apoio de excelência na vertente desportiva.
Tenho contactado com muitos pais de jovens atletas que diariamente acompanham os seus filhos no clube local e suportam literalmente tudo: inscrições, mensalidades, equipamentos ou deslocações. Quando as coisas correm bem de parte a parte é um sacrifício compensado pelo bem-estar e crescimento do atleta, mas quando existem situações de conflito ou dificuldades financeiras existem, na verdade, poucas soluções, inclusivamente do ponto de vista regulamentar.
As regras de desvinculação de atletas amadores, em especial dos menores, e as regras de compensação pela formação são matérias muito difíceis de rever, mas que indiscutivelmente merecem ser discutidas quando não nos podemos dar ao luxo de perder estes praticantes que sustentam a base do nosso futebol.
Sendo o aumento do número de praticantes essencial para o nosso modelo de desenvolvimento, este será um tema que a próxima legislatura não poderá ignorar: como dotar a formação desportiva dos meios logísticos e financeiros para retirar, pelo menos, parte do ónus às famílias que carregam hoje um fardo pesado.
É desta base formativa que se chega ao topo e podemos disfrutar de um dérbi como o desta quinta-feira entre Sporting CP e SL Benfica, bem disputado, com respeito enorme entre os jogadores de ambas as equipas e um espetáculo apaixonante até ao último minuto. No final falou-se muito de arbitragem e de todos os defeitos que se querem colocar na estratégia de uma ou da outra equipa. Portugal no seu melhor, deixamos que sejam os que nos acompanham noutros países a enaltecer a fábrica de talento que conseguimos criar.
Termino com uma homenagem à Filipa Mandeiro. Mais uma perda irreparável que recordaremos não só pela atleta, mas pelo ser humano que foi. Descansa em paz.
Artigo de opinião publicado em: jornal Record (3 de março de 2024)