Da reconciliação ao debate em falta

O Professor Treinador Carlos Queiroz, assim foi introduzido na cerimónia de atribuição do Doutoramento Honoris Causa, pela Universidade Lusófona, deixou ao auditório que o acompanhou neste momento especial um discurso clarividente, reconciliador e profundamente honesto. Dirigiu-se aos amigos e referências que o ajudaram no caminho, mas também aos que agora iniciam a profissão de treinador, projetando com enorme lucidez o que ainda está para vir.
Devemos-lhe uma revolução consciente e silenciosa do futebol português, o contributo para a quebra do preconceito e abertura do futebol ao conhecimento científico, a paternidade de uma geração de ouro que conquistou dois títulos mundiais e construiu o legado de vitória que viria a dar dimensão mundial ao jogador nacional. Foi uma honra assistir a este ato de reconhecimento pelo mundo académico e partilhar com muitos dos seus discípulos do mundo desportivo o sentimento de justa homenagem e agradecimento por uma carreira singular.
Passando ao debate sobre o Orçamento de Estado, ou à falta dele, já não é surpresa que o desporto é um parente pobre e nem com a consciência do seu impacto económico, direto ou indireto, parece haver disponibilidade, como alertaram os clubes, para rever a carga fiscal. Na ótica do jogador há também múltiplas questões por refletir e provisionar adequadamente. Apoios concretos às carreiras duais, implementação do fundo de pensões e regime de proteção social na doença, incentivos à empregabilidade de ex-jogadores, sustentados em medidas de apoio à transição de carreira para o setor empresarial, apoios concretos para programas que desenvolvam o desporto feminino e igualdade de oportunidades para as mulheres desportistas, incentivos para a integração de refugiados, migrantes e populações marginalizadas através do desporto formal ou via setor social, financiamento para a requalificação ou capacitação de infraestruturas e espaços de desporto, cultura e lazer, para combater a ociosidade, aos índices de absentismo e abandono da prática desportiva. Apoios ao esforço enorme que as famílias fazem para que os jovens possam praticar desporto. No próprio orçamento para a saúde, provisionar apoios no acesso à prática desportiva como fator de prevenção. Tanto que havia por debater sobre um orçamento que pudesse traduzir uma visão holística das necessidades dos desportistas. Se existe algum debate, tem certamente sido feito em círculos demasiado restritos.
Termino com uma mensagem de agradecimento aos nossos bombeiros e forças de segurança, pelo combate inglório que permitiu evitar uma catástrofe ainda maior. Momentos como este fazem-nos sentir impotentes e compreender o quão frágil pode ser a nossa sensação de segurança. Voltamos a ter de reerguer-nos e encontrar soluções para o problema estrutural que os incêndios representam no nosso país.
Artigo de opinião publicado em: jornal Record (22 de setembro de 2024)