As discussões que a pandemia apressou


Passaram cinco anos desde a declaração oficial da pandemia pela OMS e o mundo do desporto viveu em sufoco com a suspensão de competições, a perda abrupta de receitas e toda a avalanche de problemas que destruiu clubes, afetou a estabilidade das relações laborais desportivas, potenciou o desemprego e os casos de emergência social.

Vivemos a incerteza sobre o mundo que teríamos após a descoberta da vacina e como iriam os jogadores e as suas famílias lidar com os riscos para a saúde, numa retoma progressiva com grandes restrições. Foi um período para refletir e em Portugal, no futebol, soubemos dar o exemplo de concertação social que faltou em muitos países, não podendo deixar de destacar a articulação entre a FPF, a Liga e o Sindicato dos Jogadores. 

Colocámos em prática, de imediato, o plano para reforço do Fundo de Solidariedade, ativámos em muitos casos o Fundo de Garantia Salarial e disseminámos a linha direta de assistência psicológica, determinante para apoiar em momentos inevitáveis de ansiedade e instabilidade emocional. 

Não estou certo de que tenhamos retirado da pandemia as devidas lições de humanidade. Rapidamente nos esquecemos do quão importante seria estarmos preparados para lidar com outro evento desta natureza. Foram muitos os temas que a crise de saúde pública, mergulhada numa enorme crise social, precipitou.

A proposta da Superliga, para enriquecer os super-ricos, abalou os alicerces do modelo europeu do desporto. A necessidade de potenciar receitas levou a uma reformulação desenfreada dos quadros competitivos, com o aumento exponencial de jogos no topo da pirâmide e o atropelo de direitos e garantias laborais, no que se refere à saúde e bem-estar dos jogadores. Os fenómenos de intolerância, racismo e violência, o tráfico de jovens atletas, a corrupção e manipulação de resultados, entre outros exemplos, emergiram ou cresceram a partir de um certo desprezo pela integridade e ansiedade em passar por cima dos outros. 

É sobre o futebol que queremos, o modelo europeu do desporto e o seu impacto na sociedade europeia, numa altura de tensão latente no panorama político internacional e, ainda, sobre o futuro dos jovens que querem seguir uma carreira desportiva profissional, que participarei durante a próxima semana numa reunião com o Comissário Europeu para o desporto, Glenn Micallef, integrado na delegação da FIFPRO. Um momento marcante nas relações entre os representantes dos futebolistas a nível mundial e os decisores políticos, que determinarão o plano estratégico para o desporto, a definir no presente mandato europeu. 

Artigo de opinião publicado em: jornal Record (16 de março de 2025)

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