As receitas das apostas desportivas


As receitas das apostas desportivas têm gerado duas corridas paralelas. A primeira à legítima reivindicação do aumento da percentagem global que cabe ao setor do desporto receber. A segunda, menos altruísta, à capacidade de influência na chave de repartição, sendo um daqueles exemplos em que existe mais política no desporto do que na própria política.

Novos ciclos nas lideranças das organizações desportivas mais poderosas em Portugal motivaram novas vontades em quinhoar no produto destas receitas. Já aqui alertei para o facto de ouvir cada vez mais discursos de dirigentes que omitem qualquer referência à importância, ao contributo e às necessidades dos praticantes desportivos. Mas afinal quem gera as receitas que resultam das apostas desportivas?

Quem enfrenta os fatores de risco decorrentes de abordagens relacionadas com manipulação de resultados? Quem sofre com a sobrecarga competitiva, a desregulação e o licenciamento ineficazes? Pelo debate, parece que a corrida que realmente importa não é a do aumento da parcela que cabe ao desporto, mas antes a que determinará quem tem o poder para a distribuir. Não é preciso ir muito longe para identificar vários países onde o sistema de distribuição das receitas de apostas desportivas contempla, diretamente, as entidades representativas dos praticantes e outras associações de classe a atuar no setor.

No que à classe que represento diz respeito, depois de algumas tropelias recentes como a que decorreu com o regime de acidentes de trabalho, exigia-se nesta discussão, pelo menos, uma referência pública à importância de canalizar recursos para os atletas: fomentando mais programas de formação e sensibilização para as questões relacionadas com a manipulação de resultados, saúde mental, ética e integridade, respondendo ao problema das adições com a assistência multidisciplinar necessária, ou reforçando os mecanismos de proteção e resposta ao incumprimento salarial, apoio às carreiras duais e assistência à transição de carreira.

Existem múltiplas formas de regular e atribuir receitas que possam beneficiar, diretamente, os praticantes. Estou certo de que ainda haverá tempo para os colocar no centro do debate. No terreno a prevenção das más práticas não espera por novidades e o episódio denunciado pelo Anadia demonstra bem a necessidade de manter a vigilância no terreno, contra as práticas ilícitas e comprometedoras da integridade desportiva, que se agravam habitualmente no final da época.

Artigo de opinião publicado em: jornal Record (20 de abril de 2025)

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