JORGE JESUS: treinador do SL Benfica


Para saber de futebol, é preciso saber mais do que futebol                                                   

Se há entre nós quem pretenda esquecer ou diminuir o valor do treinador Jorge Jesus, de certo não o conhece, nem tem do futebol uma visão científica, quero eu dizer: rigorosa. Por mim, coloco-o ao lado de todos os que no futebol (e são tão poucos!) se assumem como apóstolos entusiastas da aproximação interdisciplinar entre o futebol e a ciência, entre o futebol e a filosofia. Estou a ouvir o turbilhão de catilinárias e de censuras e de reticências e de gargalhadas sonoras a avançar, ameaçador, sobre o meu juízo acerca do atual treinador do Benfica. Boaventura de Sousa Santos afirmou à revista Visão (5 a 12 de Janeiro de 2012) que “temos formado conformistas incompetentes e precisamos de rebeldes competentes”. Ora, conformistas incompetentes são aqueles que desconhecem que, tanto os seres humanos, como as comunidades, são processos, não serão nunca amanhã o que são hoje; que vivemos em sociedades em aprendizagem, ou seja, em um novo tipo de sociedade em que aprender continuamente é a sua principal característica. Rebeldes competentes são também os treinadores desportivos que, repetindo o grego Sócrates, sabem que nada sabem; são também os que, como Jorge Jesus, mesmo sem grandes qualidades especulativas, procuram a total inteligibilidade do futebol, através do convívio com estudiosos doutras áreas do conhecimento, em poucas palavras: através de um trabalho interdisciplinar.

Ora, trabalho interdisciplinar é o que hoje se faz, no departamento de futebol do Sport Lisboa e Benfica, sob a exemplar direção administrativa e disciplinar de António Carraça e a enérgica liderança técnico-desportiva de Jorge Jesus. De facto, a energia, a verdadeira energia, é inteligente e consciente, é persistente e tenaz – e é esta energia e é esta vontade que (sem deixar de as reconhecer e admirar em António Carraça) quero agora salientar em Jorge Jesus, de quem sou adjunto, para honra e proveito meus, no SL Benfica. Não, não estou aqui a louvaminhar, a bajular ninguém, com intuitos inconfessáveis. Quando escrevo nesta revista, que o Dr. João Evangelista sabiamente dirige (como sábia é a sua conduta à frente do Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol) sinto-me ao serviço do futebol português e é, neste espírito de serviço, que este artigo poderá compreender-se. No seu livro Post Capitalist Society, Peter F. Drucker refere que “as mudanças que mais profundamente afetam os vários saberes não vêm das suas próprias áreas, mas doutras por vezes bem distintas. A indústria farmacêutica está a ser profundamente alterada pelos conhecimentos provenientes da genética e da biologia, disciplinas que, há quarenta anos, não encontraríamos num laboratório farmacêutico. O maior desafio dos caminhos-de-ferro não resultou das alterações nos comboios, mas sim do aparecimento do automóvel, do camião, do avião”. O futebol, se quer criar uma via de progresso, há-de transformar-se numa comunidade científica e portanto multi, inter e transdisciplinar.

E o que fazem, neste capítulo, o Real Madrid, o Barcelona, o Manchester United, o Manchester City, o Inter, o Milan, etc., etc.? Com o advento da complexidade, uma só ciência, ou um só método, não bastam à compreensão de um paradigma científico. Por isso, peço licença para repetir o que já venho dizendo publicamente, há mais de trinta anos: para saber de futebol, é preciso saber mais do que futebol. Jorge Jesus sabe isto mesmo e foi, citando-me, que me convidou a ingressar, na sua equipa de trabalho. “O Jorge Jesus?” questionarão os que se reclamam de ciência e de cultura. A minha resposta é esta: Sim, o Jorge Jesus, atual treinador do SL Benfica!

Para mim, filósofo (modestíssimo embora) que sou, a filosofia é, sobre o mais, como o afirmava o meu colega de curso, na Universidade, Mário Sottomayor Cardia: “hábito mental, espírito crítico, predisposição intelectual” – tudo isto que está, paulatinamente, a emergir do departamento de futebol onde trabalho. Porque eu lá estou? Não, porque o Jorge Jesus o quer!     

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