Comunicação conjunta da Comissão de Diálogo Social
Sindicato dos Jogadores, Liga Portugal, APAF e ANTF apreensivos com a proposta de Orçamento de Estado para 2024.
A Comissão de Diálogo Social, composta por Associação Nacional de Treinadores de Futebol (ANTF), Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol (APAF), Liga Portugal e Sindicato dos Jogadores, e criada para discutir, em conjunto, os temas mais relevantes para o futuro e o desenvolvimento do futebol profissional, vem por este meio expressar a apreensão suscitada pela proposta de Orçamento de Estado para 2024 apresentada pelo Governo e apelar ao envolvimento de V. Exa., enquanto Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, no sentido de vermos atendidas algumas das preocupações que lhe temos transmitido.
O desporto em Portugal, nomeadamente o futebol e, por consequência, todos aqueles que compõem o seu universo, vivem tempos desafiantes. Tempos que não nos permitem permanecer em silêncio perante aquilo que consideramos um tratamento claramente discriminatório e altamente penalizador para com uma indústria que se tem assumido, de forma cada vez mais evidente, como um dos motores da economia portuguesa.
É também inegável a contribuição do futebol, e dos seus principais intervenientes, na projeção do país no exterior. Jogadores, treinadores, clubes e árbitros desempenham um papel cada vez mais relevante na promoção de Portugal no mundo. Diríamos até que não existe qualquer dúvida quanto ao peso assumido pelo futebol nesta matéria quando comparado com outras indústrias nacionais. O reconhecimento internacional do futebol português e dos seus intervenientes é, hoje, indiscutível.
Constatamos, contudo, que não recebemos o mesmo reconhecimento por parte daqueles que, em Portugal, deveriam zelar pela sustentabilidade e desenvolvimento de uma indústria tão relevante como aquela que representamos. Uma constatação que ganhou ainda mais força perante a proposta de Orçamento de Estado para 2024, em discussão na Assembleia da República. Uma proposta que não só continua a negar ao futebol, e aos seus intervenientes, apoios há muito reivindicados, mas que consegue, ainda, retirar-lhes alguns dos poucos benefícios que lhes foram concedidos em propostas anteriores.
Permita-nos que lhe recordemos que o futebol, e os seus intervenientes, ultrapassaram um dos períodos mais difíceis com que todos tivemos de lidar, o da pandemia de Covid-19, sem qualquer dos benefícios concedidos a outras áreas da sociedade. Soubemos compreender o momento e enfrentámos, em conjunto enquanto indústria, mas isolados a nível de apoios, as muitas dificuldades com que nos debatemos. Fizemos, então, prova inequívoca de compromisso, responsabilidade e respeito para com o país e para com quem tem a incumbência de o governar.
Mas a verdade é que não encontramos estes predicados na proposta de Orçamento de Estado para 2024 recentemente apresentada pelo Governo. Tal como nela não encontramos reflexo das preocupações suscitadas por jogadores, treinadores, clubes e árbitros junto de V. Exa. desde que assumiu a pasta do desporto.
A taxa de IRS, cuja redução proporcionaria melhores condições a todos os intervenientes da indústria do futebol, mantém-se inalterada, permanecendo uma das mais altas da Europa, promovendo desigualdades gritantes. O mesmo acontece relativamente ao IVA na bilhética, que continua a alimentar o fosso entre o futebol e todas as outras áreas de entretenimento, em claro prejuízo da indústria como um todo. As reivindicações do futebol profissional, com vista à redução dos custos de contexto, tão penalizadores para os clubes, continuam a ser, apesar de todos os esforços realizados pela Liga Portugal, consecutivamente, ignoradas.
Os futebolistas, representados pelo Sindicato dos Jogadores, continuam a não ter a proteção estabelecida para as profissões de desgaste rápido, numa carreira de elevado risco e curta duração. E estão ainda impedidos de receber subsídio de doença, fruto do regime contributivo em vigor, o que os desprotege no caso de doença não profissional (exemplo: problemas oncológicos), excluída da cobertura pelo regime de acidentes de trabalho.
Continua adiada a alteração do regime legal dos fundos de pensões, que permitiria criar condições para que os praticantes descontem complementarmente ao regime de Segurança Social.
Deste modo, é também importante o reforço ao apoio às carreiras duais, reclamando-se igualmente um incentivo financeiro concreto aos atletas e às entidades desportivas e empresariais que apostem na sua contratação, bem como à transição e reconversão profissional dos futebolistas.
Tal como a criação de um mecanismo de apoio e resposta financeira do Estado a casos de emergência social de ex-jogadores profissionais de futebol, que na idade legal para pedir a reforma junto da Segurança Social se têm deparado com o facto de não terem sido efetuados descontos necessários.
Do mesmo modo, a Associação Nacional de Treinadores de Futebol há muito identificou como fundamental um enquadramento jurídico-legislativo específico à classe, desde logo no que ao acesso ao subsídio de desemprego diz respeito.
Ainda por forma a permitir o regresso ao território nacional e o exercício profissional imediato dos treinadores portugueses que tenham desempenhado a sua atividade profissional, nos anos anteriores, no estrangeiro, propõe-se a criação de um regime específico que fixe uma taxa mais favorável de tributação dos rendimentos.
Importante seria também a criação de uma taxa de tributação especial para os rendimentos auferidos pelos treinadores portugueses, no estrangeiro e não declarados em Portugal e/ou auferidos em país com regime fiscalmente favorável, que pretendam voltar, em definitivo, para Portugal, e transferir os mesmos para bancos nacionais.
A nível de arbitragem, representada pela Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol, é necessário aumentar as bolsas para os jovens árbitros e árbitras que arbitram a nível distrital, face ao aumento nas diversas despesas (alimentação e combustíveis).
É, ainda, necessário que o IVA de equipamentos e diversos materiais de arbitragem seja reduzido e que por último seja revista a questão de benefícios fiscais aos dirigentes de arbitragem que trabalham gratuitamente em prol do futebol nacional/distrital e que permitem que milhares de jogos se realizam com equipas de arbitragem.
De extrema importância é a criação do estatuto de juiz árbitro, pois é incompreensível que num futebol profissional se continue a ter um dos principais agentes sem qualquer estatuto que lhe possa garantir estabilidade de carreira e, acima de tudo, uma garantia de uma carreira contributária justa que garanta minimamente uma pós-carreira adequada.
Mais uma vez, percebemos que nenhuma das preocupações que, em conjunto ou particularmente, temos demonstrado, encontra espaço nesta proposta de Orçamento de Estado para 2024.
Constatamos, ao invés, que até um dos poucos benefícios de que o futebol, e os seus intervenientes, usufruiu – mesmo que não pensado em exclusivo para o futebol – nos últimos anos, graças ao programa Regressar, nos é agora sonegado, com o estabelecimento de um teto (este sim parece, lamentamos dizer-lhe, pensado em exclusivo para o futebol…) que limita o regresso de jogadores e treinadores a Portugal, forçando-os a continuarem emigrados se quiserem manter condições semelhantes àquelas que encontram no estrangeiro.
Tendo em conta a proximidade que V. Exa. sempre demonstrou, desde que assumiu a pasta do desporto, com o futebol e todos os seus intervenientes, escrevemos-lhe na expetativa de que possam ser corrigidas algumas das injustiças que encontramos na proposta de Orçamento de Estado para 2024.
Sabendo que o documento estará, agora, num período de discussão na generalidade e na especialidade, e embora entendamos que o atual momento político é limitativo das ações do Governo, temos esperança de na sua versão final vermos ainda refletidas, pelo menos, algumas das preocupações por nós expressas, tanto nesta carta como nos diversos encontros que com V. Exa. mantivemos.
Apelamos-lhe ainda, em conjunto, para que, como Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, promova os passos necessários para que, sempre num ambiente de responsabilidade e consenso, as nossas preocupações possam ser debatidas em sede própria, de modo a quem possamos minimizar o impacto negativo que, se aprovado nos moldes da sua versão original, o Orçamento de Estado acarretará para o futebol e todos os seus intervenientes.
Informamos ainda que daremos conta das nossas preocupações junto do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, na expetativa de podermos ver ainda expressas na proposta final do Orçamento de Estado para 2024 algumas das justas reivindicações do futebol profissional e dos seus principais intervenientes.