Saúde mental no desporto debatida em conferência

Matilde Fidalgo, Pedro Almeida e Vítor Cotovio avaliaram o impacto psicológico na performance desportiva.
Pelo segundo ano consecutivo, o Sindicato dos Jogadores associou-se à Casa de Saúde do Telhal (CST) para assinalar o Dia Mundial da Saúde Mental, que se celebra esta quinta-feira, 10 de outubro.
No âmbito desta data, foi promovida a conferência “Saúde Mental no e através do Desporto”, que contou com a participação de três oradores: a futebolista e assessora do Sindicato dos Jogadores para o futebol feminino, Matilde Fidalgo, o psicólogo do desporto Pedro Almeida e o diretor clínico da CST, Vítor Cotovio.
Os três protagonistas do debate avaliaram o impacto psicológico no rendimento desportivo dos atletas, com a internacional portuguesa Matilde Fidalgo a dar o testemunho da sua própria vivência.
“Quando fui para Inglaterra, para o Manchester City, senti pressão porque fui para um patamar superior àquele a que estava habituada e tinha de competir com jogadores de imensa qualidade. Isso interferiu com a auto perceção da minha qualidade e entrei num estado de ansiedade bastante grande. Havia alturas em que percebia que nem sempre o meu melhor chegava”, admitiu a defesa lateral.
Pedro Almeida, psicólogo do desporto e professor no ISPA, realçou que os atletas devem concentrar-se naquilo que conseguem controlar e elencou alguns fatores que podem condicionar o desempenho desportivo: “Estarmos fora do nosso país, da nossa casa, numa equipa ou com um treinador com o qual não nos relacionamos tão bem e sairmos da nossa zona de conforto não contribui para o bem-estar do atleta.”
O diretor clínico da CST, psiquiatra e psicoterapeuta, Vítor Cotovio, lembrou que determinados comportamentos dos atletas resultam do seu estado psicológico e que isso deve ser objeto de análise. “Alguns treinadores acham que são psicólogos, porque são motivadores, mas daí a acharem que podem desvalorizar o papel do psicólogo perante um atleta vai uma grande distância.”
Matilde Fidalgo corroborou esta opinião: “A minha incapacidade de perceber o que ia na cabeça do treinador causou-me algumas dificuldades nos últimos anos para poder desfrutar do jogo. Muitas vezes tinha um sentimento de bloqueio porque a ansiedade e o stress de tentar perceber o que ia na cabeça do treinador aconteceu-me com muita frequência.”
O Sindicato dos Jogadores tem à disposição dos futebolistas uma rede de 400 psicólogos em todo o país, oferecendo as quatro primeiras consultas, dispondo de uma linha de apoio para o efeito. Matilde Fidalgo destacou a prestação deste serviço e explicou o porquê: “Os atletas não confiam nos psicólogos dos clubes, porque suspeitam que possa existir comunicação entre o psicólogo e o treinador. Este tipo de apoio deverá vir de fora, para que os jogadores se sintam mais confortáveis, e é por isso que o Sindicato tem à disposição dos jogadores uma linha para a qual podem ligar e recorrer a psicólogos independentes.”
No futebol de formação, o suporte mental torna-se ainda mais imperioso. “Nas camadas jovens, o trabalho do psicólogo tem de ser mais sistémico. Se um jovem não se sentir à vontade para falar com um psicólogo, podemos falar com as pessoas que estão à volta dele e que o possam ajudar, através de um treinador-adjunto, dos pais ou do agente. Podemos agir de forma direta ou indireta”, reforçou Pedro Almeida.
Nesta medida, Vítor Cotovio entende que os pais devem ter competências de liderança para poderem orientar os filhos da melhor forma possível: “Os pais projetam muitas expetativas nas crianças, que por sua vez querem ser reconhecidas. É fundamental que, além de pais, sejam também psicólogos dos próprios filhos.”
Jogo solidário entre ex-futebolistas e utentes da CST
Após a conferência, realizou-se um jogo de futebol solidário entre ex-futebolistas profissionais e alguns utentes da Casa de Saúde do Telhal, em Mem Martins.
Mais do que o resultado, para a história fica o espírito solidário de ex-jogadores profissionais de futebol com utentes da CST, que sofrem de perturbações mentais e que tiveram um dia bem mais animado e diferente daquilo a que estão acostumados.
Entre os ex-jogadores que se associaram a esta iniciativa solidária, estiveram presentes Bruno Basto, Anselmo, Carla Couto, João Paulo, José Carlos, Manuel José, Matilde Fidalgo, Rebelo, Tiago Pereira e Valter Onofre.