O jogador não é mercadoria
No ano de 2025 assinalam-se 30 anos sobre o acórdão Bosman, a decisão judicial mais importante para a proteção da liberdade dos futebolistas, com impacto em toda a jurisdição FIFA. Com esta decisão, os jogadores podem hoje ajustar as suas expectativas à duração estabelecida para o contrato de trabalho e sabem que nos últimos seis meses são livres para negociar e vincular-se a um compromisso seguinte, sem qualquer poder de retenção por parte do clube empregador.
Nem sempre esta transição se faz de forma pacífica e quando existe uma clara diretriz do clube para impor a renovação é normal que haja tentativas de pressão, via diminuição das condições de trabalho que o jogador tinha até então, ou perda de protagonismo nas escolhas do treinador.
A salvaguarda das garantias laborais dos jogadores, no que diz respeito ao escrutínio das suas condições de trabalho, carece de mecanismos mais eficazes de fiscalização e proteção em Portugal. É certo que a lei proíbe o assédio e todos os comportamentos discriminatórios, como o afastamento do jogador do plantel, seja por motivo de pressão para renovar o contrato ou pelo motivo oposto, de forçar a rescisão e libertação da sua inscrição.
O dia a dia dos jogadores, alguns com carreiras bem sólidas, é frequentemente interrompido por decisões administrativas desta natureza, que ao colocarem um travão no normal desenvolvimento de uma carreira desportiva provocam danos que não se circunscrevem à eventual indemnização exigível, no caso de rescisão com justa causa.
Os jogadores não são mercadoria, são antes um grupo profissional heterogéneo. Estando o topo da pirâmide protegido por boas condições financeiras, abaixo luta-se pela possibilidade de fazer uma carreira que garanta algum conforto financeiro, pelo menos para fazer a transição sem sobressaltos. A reflexão que vale para as condições mínimas de trabalho dos jogadores, no que respeita ao cumprimento dos contratos em relação à integração do plantel e possibilidade de treinar em condições de normalidade, vale igualmente para o estatuto de profissão de desgaste rápido como um todo, da proteção na doença ao acesso à reforma, sendo uma reflexão urgente, já transmitida pelo Sindicato dos Jogadores ao Governo.
É de elementar importância devolver alguma justiça social aos praticantes desportivos profissionais como um todo. Do lado do futebol, cabe refletir sobre mecanismos de proteção dos mais fragilizados, como bem exemplificou mais um projeto ruinoso no distrital, que motivou a desclassificação da Portosantense SAD e desproteção de dezenas de atletas a meio da época desportiva.
Artigo de opinião publicado em: jornal Record (5 de janeiro de 2025)